Vida de bolseiro
A Associação de Bolseiros de Investigação Científica organizou um protesto, chamando a atenção para um problema com raro eco público: a precariedade da condição de bolseiro em Portugal.
Como seria de esperar, a imprensa decidiu lidar com o evento de um modo superficial e sensacionalista. As televisões limitaram-se a mostrar uma série de pessoas a montarem umas tendas de campismo em frente ao Parlamento, “as quais” – dizia a repórter – seriam “símbolo das suas dificuldades”. Em seguida, e depois de registar o protesto “dos jovens bolseiros precários”, a mesma afirma, em tom jocoso: “mas a idade de alguns manifestantes pareceu oferecer dúvidas”. Imagem seguinte: uma senhora nos seus sessenta anos, queixando-se (justamente) de algumas incoerências na atribuição de bolsas. Palavras que, naturalmente, estavam condenadas ao desdém dos espectadores, conduzidos por aquele gracejo jornalístico.
Os jornais seguiram caminho semelhante. O “Público” traz o assunto para primeira página, mas eis que encontramos de novo o mesmo registo: “Serão pelo menos 8000 os bolseiros de investigação científica em Portugal: jovens investigadores que só conseguem passar de bolsa em bolsa, sem conseguirem um emprego a sério”. Aparentemente, os bolseiros andam a jogar ao berlinde. O seu único desejo é conseguirem arranjar um patrão que pague bem e um trabalhito das 9 às 5.
Aparte esta zombaria, diga-se que o protesto falhou na identificação de alguns problemas vitais. Na realidade, houve espaço para um pouco de tudo: reivindicações certeiras (a inclusão do bolseiro no regime geral da Segurança Social), razoáveis, mas discutíveis (a atribuição de subsídio de férias) e francamente exóticas (o pagamento de um subsídio de desemprego, quando a bolsa terminar).
No meu entender, não se mencionaram as duas principais lacunas do Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica.
Por um lado, o facto de as bolsas não serem actualizadas regularmente. A última revisão ocorreu no já distante ano de 2002. Com o crescimento da inflação, e por vias do seu congelamento, as bolsas sofrem anualmente um decréscimo significativo em relação ao custo de vida – o que contribui para o adensar da precariedade do bolseiro.
Por outro, a impossibilidade de os bolseiros contraírem empréstimos bancários. Apesar de previstas para um tempo relativamente longo (na sua maioria de 4 a 6 anos), as bolsas são sujeitas a uma reapreciação anual. Perante este cenário, os bancos dificultam – ou pura e simplesmente rejeitam – a concessão de empréstimos de médio ou elevado valor. Era fundamental que o Estado estabelecesse um protocolo com as entidades bancárias para moderar o processo. Afinal, os bolseiros às vezes andam de carro e, diz-se por aí, também gostam de comprar casa própria.
Como seria de esperar, a imprensa decidiu lidar com o evento de um modo superficial e sensacionalista. As televisões limitaram-se a mostrar uma série de pessoas a montarem umas tendas de campismo em frente ao Parlamento, “as quais” – dizia a repórter – seriam “símbolo das suas dificuldades”. Em seguida, e depois de registar o protesto “dos jovens bolseiros precários”, a mesma afirma, em tom jocoso: “mas a idade de alguns manifestantes pareceu oferecer dúvidas”. Imagem seguinte: uma senhora nos seus sessenta anos, queixando-se (justamente) de algumas incoerências na atribuição de bolsas. Palavras que, naturalmente, estavam condenadas ao desdém dos espectadores, conduzidos por aquele gracejo jornalístico.
Os jornais seguiram caminho semelhante. O “Público” traz o assunto para primeira página, mas eis que encontramos de novo o mesmo registo: “Serão pelo menos 8000 os bolseiros de investigação científica em Portugal: jovens investigadores que só conseguem passar de bolsa em bolsa, sem conseguirem um emprego a sério”. Aparentemente, os bolseiros andam a jogar ao berlinde. O seu único desejo é conseguirem arranjar um patrão que pague bem e um trabalhito das 9 às 5.
Aparte esta zombaria, diga-se que o protesto falhou na identificação de alguns problemas vitais. Na realidade, houve espaço para um pouco de tudo: reivindicações certeiras (a inclusão do bolseiro no regime geral da Segurança Social), razoáveis, mas discutíveis (a atribuição de subsídio de férias) e francamente exóticas (o pagamento de um subsídio de desemprego, quando a bolsa terminar).
No meu entender, não se mencionaram as duas principais lacunas do Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica.
Por um lado, o facto de as bolsas não serem actualizadas regularmente. A última revisão ocorreu no já distante ano de 2002. Com o crescimento da inflação, e por vias do seu congelamento, as bolsas sofrem anualmente um decréscimo significativo em relação ao custo de vida – o que contribui para o adensar da precariedade do bolseiro.
Por outro, a impossibilidade de os bolseiros contraírem empréstimos bancários. Apesar de previstas para um tempo relativamente longo (na sua maioria de 4 a 6 anos), as bolsas são sujeitas a uma reapreciação anual. Perante este cenário, os bancos dificultam – ou pura e simplesmente rejeitam – a concessão de empréstimos de médio ou elevado valor. Era fundamental que o Estado estabelecesse um protocolo com as entidades bancárias para moderar o processo. Afinal, os bolseiros às vezes andam de carro e, diz-se por aí, também gostam de comprar casa própria.
1 Comments:
Pobre país que não leva a sério a existência de alguns que têm a coragem de se propor realizar um trabalho de investigação e trabalho árduo de provar perante a Academia que têm algo de novo e importante para que "o mundo pule e avance".
Infelizmente a comunicação social trata com a mesma ligeireza uma manifestação de bolseiros ou qualquer buraco na esquina duma ruela.
Para sorrir, aquela da "velhinha" aparecer a defender aqueles que ela achou mais desprotegidos, até podia ser um neto ou então foi a única oportunidade que teve de aparecer na televisão.
E para terminar uma pergunta: será que osenhor Engenheiro Sócrates já sabe que lá fora há instituições que levam a sério os bolseiros e aproveitam o seu potencial?
Quando da atribuição do prémio nobel da medicina deste ano os jornais noticiaram que na equipa do tal senhor que foi premiado tem na sua equipa um colaborador português. Será porque lhe ofereceram condições de trabalho que aqui jamais teria acesso?
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