segunda-feira, julho 28, 2008

Não me chamem já "fascista"

"O CDS-PP vai pedir na reabertura do Parlamento uma investigação rigorosa à distribuição do rendimento social de inserção. O anúncio foi feito por Paulo Portas, que considera inadmissível que uma parte do país trabalhe para que outra viva do subsídio."

Eu sei que isto é um bocadinho demagógico - e na boca de Paulo Portas tem o objectivo populista que todos conhecemos. Mas o princípio de fundo parece-me correcto. O Rendimento Social de Inserção tornou-se um tema tabu na política portuguesa: todos suspeitamos de que ele é mal aplicado, de que é injusto em muito casos e verdadeiramente absurdo noutros. E todavia, ai daquele que o puser em causa.

É fundamental ultrapassar esta barreira criada pelo "politicamente correcto" e averiguar se, num momento de crise em que a contenção do Estado é absolutamente necessária, não se justificaria fazer cortes significativos neste género de subsídios.

O Paraíso na Terra

"É certo que [...] «não há eleições em Angola desde 1992». Mas mesmo sem discutir se isso basta para não gostar do governo e do presidente (sentimentos são sentimentos), conviria acrescentar que desde as eleições de 1992 houve uma década de guerra civil, que deixou o País ainda mais destruído; que, apesar disso, o parlamento e os partidos (incluindo a Unita) continuaram a funcionar regularmente ao longo deste tempo; e sobretudo que neste momento decorre a campanha eleitoral para eleições parlamentares, que tudo indica não ficarão a dever nada à liberdade política e à lisura democrática, estando também previstas eleições presidenciais no próximo ano. Em matéria de liberdade política e de aposta democrática, prouvera que houvesse muitas angolas em África..."

Vital Moreira, no Causa Nossa.

sexta-feira, julho 25, 2008

Obama em Berlim


1. Num discurso complexo, notável a referência a uma dinâmica absolutamente fundamental para o futuro das relações internacionais: o regresso ao multilateralismo e à cooperação. Os Estados Unidos não podem interpretar a sua posição de domínio no panorama mundial como um mandato para exercerem acções militares ilegítimas, baseadas em interesses puramente estratégicos. Por outro lado, ao insistir na ideia de um diálogo com a Europa, Obama sublinha a importância de os próprios europeus se envolverem na resolução dos grandes problemas mundiais - em vez de persistirem numa lógica de desresponsabilização que grassa no Velho Continente.

2. "Nunca vires as costas a um urso", reza um provérbio político americano. Inspirando-se neste preceito, Obama parece insistir igualmente na urgência em retomar as conversações com adversários clássicos das democracias ocidentais e dos Estados Unidos em particular. Este género de relações não tem que ser necessariamente amistoso, nem levar a uma política de apaziguamento; mas denota uma clara percepção de que será mais fácil resolver os conflitos e procurar soluções mutuamente satisfatórias se incluirmos os nossos adversários na mesa de negociações, em vez de os ameaçar com bombas e mísseis.

3. Não faltarão observadores que descrevam as posições de Obama como "ingénuas". Mas nesse caso, pergunto: quem é mais "realista"? Os ideólogos neo-conservadores, para quem o mundo se divide entre os bons e os maus, e para quem a democracia é um produto de acção instantânea? Ou aqueles que olham para o mundo islâmico como uma realidade multifacetada; que interpretam os movimentos políticos como processos dinâmicos e singulares, e que consideram que o triunfo da liberdade exige conquistas sociais e culturais para além de simples "mudanças de regime"?

4. Bem sei que quando Obama se auto-intitulou "cidadão do mundo" evocava directamente o discurso de Kennedy em 1963, e um outro de Reagan nas Nações Unidas. Mas quando o eleitorado norte-americano levanta dúvidas sobre o seu patriotismo, teria sido prudente evitar uma referência deste género. Não chegou a ser uma gaffe, mas nos próximos dias vai falar-se e muito desta afirmação - mesmo que para os europeus ela seja pouco mais que banal.

terça-feira, julho 22, 2008

[Pub.]

Este vosso escriba estará presente no programa televisivo "Clube de Imprensa" (4ª feira, 23.30h, RTP2), que conta com a participação de José Lamego, Carlos Gaspar e a moderadora Teresa de Sousa. Um debate em torno da visita de Obama ao Médio Oriente e à Europa, e a propósito das eleições americanas, da política externa dos EUA e desse fenómeno particular que é a "obamania". Passa um pouco tarde, mas espero que valha a pena.

segunda-feira, julho 21, 2008

Terceira recomendação

"Sou um homem doente... Sou um homem mau. Um homem repulsivo, é isso que eu sou. Acho que tenho alguma coisa no fígado. De qualquer modo, não entendo que raio de doença é a minha, não sei ao certo o que me faz sofrer. Não me trato, nunca me tratei, embora respeite a medicina e os doutores. [...]. Sim, é por maldade que não me trato. Aposto, meus senhores, que isso é uma coisa que não compreendeis. Mas eu, sim! Evidentemente, não serei capaz de explicar-vos a quem ando eu a tramar seguindo desde modo a minha maldade; sei perfeitamente que não ando a tramar os médicos quando recuso tratar-me; sou a pessoa mais bem colocada para saber que isso só a mim prejudica e a mais ninguém. Mesmo assim, se não me trato é por maldade. Dói-me o fígado. Tanto melhor, pois que me doa ainda mais!"

Coisas boas

Acordar a meio da noite com o calor, ligar o ipod, ouvir o Adagietto de Mähler (pela orquestra de Berlim conduzida por Karajan) e sentir toda a pele das costas e das têmporas a arrepiar-se com aquele final estrondoso.

Como o desabrochar cego de uma flor na noite...

domingo, julho 20, 2008

Segunda recomendação

Não é propriamente uma novidade, mas a Fábrica do Braço de Prata é hoje um dos mais entusiasmantes locais de Lisboa. Notáveis e diversificadas exposições, múltiplos concertos de jazz, fado e música erudita, cinema, conferências e debates (com personalidades nacionais e internacionais), bar bem apetrechado (e também não se come mal, dizem-me), uma óptima livraria e um espaço verdadeiramente fenomenal. Por incrível que pareça, é frequentado por muita gente. Muita mesmo. Espreitem o site. E visitem, se puderem.

Primeira recomendação

Este excelente texto de Pedro Rolo Duarte, sobre uma das piores pragas que se abateu sobre as nossas cidades contemporâneas: o ruído. Lisboa é um óptimo exemplo: insuportável música ambiente nos cafés, nas lojas, nas livrarias, no metro; obras em cada esquina; toques de telemóvel no cinema e no teatro; uma galhofa infindável nas bibliotecas; gritos e buzinas um pouco por todo o lado. O silêncio é um bem totalmente desvalorizado na sociedade actual.

Tentando regressar

Por obrigações profissionais tem sido quase impossível escrever com regularidade neste nosso cantinho blogosférico. Mas parece-me que o pior já passou. Nos próximos tempos procurarei pois aparecer mais vezes por aqui.

sexta-feira, julho 18, 2008

Montesquieu tinha razão?

Montesquieu dizia que uma das razões mais importantes por que os países do sul são muito mais atrasados em relação aos do norte consiste na diferença de temperatura: onde faz mais frio, as fibras do corpo contraem-se, e a actividade, a produção, tornam-se como que uma estratégia de resistência; onde faz mais calor, as fibras do corpo dilatam-se, tudo descontrai, e a inactividade devém constante.

Hoje, no sítio onde moro, por volta das 15h30, os termómetros chegaram aos 36,5º. Temperatura pouco compatível com um profícuo exercício de filosofia. É caso para dizer: hot enough for you?

quinta-feira, julho 17, 2008

Quando 2 são 20

Ver Aimar e Rui Costa lado a lado viola as minhas, já de si fracas, percepções matemáticas: dois sujeitos, um n.º 10, outro n.º 10. Os dois são vinte.

Faz o que eu digo, não faças o que eu faço

Parece que o Papa terá apelado na Austrália a que se refreassem os consumismos insaciáveis espalhados por esse mundo. Fê-lo do alto de um púlpito, ao qual chegou via paquete de luxo.

terça-feira, julho 15, 2008

O PS e as sondagens: «nós queremos é o voto»

Numa das últimas sondagens, o PS consegue aumentar nas intenções de voto, apesar de os inquiridos da mesma amostra aumentarem o descontentamento perante o governo. É algo parecido com um "posso ter de fazer o que dizes, mas não tenho de gostar".

José Sócrates, provavelmente, esfrega as mãos de contente. Ele quer é o voto. Que interessa o motivo que leva ao voto?

Ou, nas palavras de Spinoza: «não é, efectivamente, a razão da obediência, mas sim a obediência mesma, que faz o súbdito. Porque seja qual for a razão pela qual um homem decide executar as ordens do soberano - o medo do castigo, a esperança de ober alguma coisa, o amor da pátria ou qualquer outro afecto -, a deliberação é sempre sua e, todavia, age sob as ordens do soberano.»
Tratado Teológico-Político, cap. XVII
(trad. Diogo Pires Aurélio)

Ir à frente, mas sem virar as costas aos de trás

Dizem más-línguas (e em matéria de futebol, em especial nesta altura do ano, são as únicas línguas que se encontram) que o Futebol Clube do Porto (porque é que neste clube se tem sempre de dizer o nome todo por extenso?!) está agora em tentativa de contratar outro jogador apontado como interesse dos grandes rivais de Lisboa, o Benfica. Parece que Quique Flores escolhe, Pinto da Costa escuta: faz um pouco lembrar aquelas pessoas nos restaurantes, mais atentas ao que se diz na mesa ao lado do que na sua.

Nestes últimos 30 anos, o Futebol Clube do Porto foi de longe o melhor clube português. Destacadíssimo na corrida com os outros. Mas, por muito avanço que tenha, nunca vira as costas ao adversário de vermelho: digamos que corre muito depressa, embora corra ao contrário...

segunda-feira, julho 14, 2008

Bruni-Sarkozy

Vai sendo difícil encontrar quem elogie Carla Bruni seja pelo que for. Mas não é para admirar, considerando que conseguiu reunir os dois maiores motivos de inveja e ódio entre humanos: uma beleza célebre e uma ocupação do espaço máximo de exercício de um poder político, ainda por cima de um dos mais poderosos Estados do mundo.

Para compor o ramalhete, só lhe faltava mesmo ser americana e benfiquista...

Coisas que quase me parecem paradoxais

Gente de etnia cigana a exigir ao Estado a doação de casas, por motivo de viver em permanente insegurança.

(Mas os ciganos não são um povo tradicionalmente nómada, sem gosto por autoridades externas? E neste caso concreto, os que invocam insegurança não são os mesmos que pareciam armados até aos dentes?)

sexta-feira, julho 11, 2008

Funny Games


Há coisas que continuam a deixar-me perplexo. Porquê refazer em inglês um filme que já fora feito noutra língua, o qual já de si parece resumir-se a reminiscências de um outro, mais antigo, e muito melhor, A Laranja Mecânica?

Só talvez pela introdução da brilhante (e lindíssima: concorda-se com tudo o que disse aqui Pedro Mexia) Naomi Watts e do excelente Michael Pitt...

"Escravatura moderna"

Muita "escravatura moderna" nas transferências do futebol mundial, acusou o presidente da FIFA referindo-se tacitamente a Cristiano Ronaldo, que concordou com o dito.

Longe de mim querer invocar La Boétie, mas quem não gostaria de ser voluntário à servidão por troco de 12 milhões de euros por ano?: e para fazer não mais que jogar à bola...

Euforias consumistas

Parece que anda muita gente excitada com o facto de hoje passar a ser vendido o célebre Iphone, por 500€.

Uma duvidança, apenas, e porventura parva: não estamos a falar de um telefone?

quinta-feira, julho 10, 2008

A frase da semana

«Não vou dizer o que penso sobre esse senhor, porque penso muito mal dele.»

Pelo inenarrável Valentim Loureiro

terça-feira, julho 08, 2008

Novidades jurídicas

Na actual aventura do futebol em Portugal, ressalta uma revolução jurídica. É que de um órgão chamado Conselho de Justiça há muito se esperaria que não proferisse justiça. Mas que não profira sequer conselho é novidade absoluta.

quinta-feira, julho 03, 2008

A Polónia e os elogios da irresponsabilidade

O presidente polaco veio dizer que, se a Irlanda votou não ao Tratado de Lisboa, a Polónia também não ratifica a coisa. É uma versão internacional do "assino, mas não concordo".

Parece um antigo vizinho meu que, quando eu era administrador de condomínio, pediu-me para pôr na ordem de trabalhos de uma reunião de assembleia a proposta sua de aumentar em 10 euros os pagamentos à senhora da limpeza, que era sua amiga pessoal. Eu fi-lo, claro, e concordei de antemão com a proposta, à qual dei o meu apoio. Na reunião, levanto a questão, dou a palavra ao proponente, demonstro o meu acordo, algumas pessoas discordam: democratiza-se a questão, vota-se. Votos a favor, 1, votos contra, toda a restante gente. Pergunto ao proponente, após reparar ter sido eu o único a mostrar aprovação: "Ó homem, então você faz uma proposta à assembleia da qual discorda?" Resposta brilhante: "Eu concordo, vizinho, mas voto pela maioria".

Moral da história: só os parvos é que insistem em ideias derrotáveis.

A melhor frase ouvida esta semana

«Do you know why this country [USA] loves guns? [...] It's because America is the land of opportunity: where any poor man can become rich, and any pussy can become a tough guy... if he has a gun in his hand.»

Do filme (estranhíssimo, aliás, não sei se detestei se adorei) Shoot'em Up.

Ingrid Betancourt

Raptada durante 6 anos, Ingrid Betancourt foi finalmente libertada numa operação militar de excelência com cooperação das melhores forças armadas do mundo. Ainda bem que o melhor emprego de força armada só demora 6 anos a tornar-se eficaz.

Nova questão impõe-se: se deixar de haver raptados pelas FARC com nacionalidade ou ascendência europeia, quem se lembrará dos pobres coitados que por lá ainda ficaram? Temo ser bem triste o destino daqueles aos quais ninguém liga importância.

Colunistas de férias

A gente compra o jornal para ler um artigo de opinião de alguém, e depara-se com um espaço preenchido com coisa nenhuma: "o cronista foi de férias". Admitindo que ser cronista de opinião é emprego com contrato de trabalho (tipicamente, não é), ter-se-á um mês de férias: isso equivale a 4 artigos de opinião.

Custa assim tanto despachar 4 artigos de opinião numa penada que sejam publicáveis ao longo desse mês em que supostamente se tiram férias?

Neste blogue, não se lançam bitaites quando a profissão mais aperta. Nos jornais, os bitaites são tidos por profissão. Que inveja!

Muito me tenho lembrado disto!

Isto é que vai uma crise...