A filosofia e o verão
Atentem num texto excelente de Desidério Murcho no De Rerum Natura, sobre a natureza da reflexão filosófica, destruindo habituais mitos: que a filosofia é incompatível com o sol e a praia, que a filosofia se limita a discutir problemas insolúveis e é por isso inútil, e que como “tudo é relativo”, a filosofia é tão válida quanto uma conversa de café entre Paula Bobone e José Castelo Branco. Alguns excertos:
"Provavelmente, o obstáculo de maior monta à filosofia foi o contacto que todos tivemos com esta disciplina no ensino secundário e universitário, onde surge como uma espécie de história de ideias estouvadas proferidas enigmaticamente por personagens de ares tresloucados mortos há séculos. [...]; o nosso sistema de ensino comprou em contrabando a ideia de que a filosofia morreu — e acabou por matá-la. Pois morre a filosofia sempre que lhe retiramos a capacidade crítica para avaliar a autenticidade dos problemas, a justeza das teorias e a solidez dos argumentos, substituindo-a por jogos de palavras e de citações, associações de ideias infantis e falsas profundidades de astrólogo. Como não preferir a isto ao imperial e ao tremoço, à toalha e ao bronzeador, ao chinelo e ao colchão?"
"O que vem então a ser a filosofia, que deu os primeiros passos num clima estival como o nosso? Não é senão o estudo de problemas que podemos caracterizar como «conceptuais». A filosofia não é sociologia de café, nem psicologia especulativa, nem poesia em prosa. A filosofia ocupa-se de problemas para os quais não há métodos formais ou científicos de solução. [...]"
"Tomemos a ideia muito popular de que «tudo é relativo». A filosofia liberta-nos do dogmatismo que consiste em repetir sem pensar que tudo é relativo só porque está na moda pensar que tudo é relativo. A filosofia permite-nos dar um passo atrás e olhar criticamente para os nossos preconceitos culturais. Que razões temos para pensar que tudo é relativo? E são essas razões também elas relativas? [...]; a filosofia [devolve-nos] o gosto pelo pensamento sem peias, pela tentativa inelutável de resolver problemas, melhorar teorias, encontrar argumentos. O que se pode perfeitamente fazer à beira-mar, conversando com outro ser humano. Ao Sol."
"Provavelmente, o obstáculo de maior monta à filosofia foi o contacto que todos tivemos com esta disciplina no ensino secundário e universitário, onde surge como uma espécie de história de ideias estouvadas proferidas enigmaticamente por personagens de ares tresloucados mortos há séculos. [...]; o nosso sistema de ensino comprou em contrabando a ideia de que a filosofia morreu — e acabou por matá-la. Pois morre a filosofia sempre que lhe retiramos a capacidade crítica para avaliar a autenticidade dos problemas, a justeza das teorias e a solidez dos argumentos, substituindo-a por jogos de palavras e de citações, associações de ideias infantis e falsas profundidades de astrólogo. Como não preferir a isto ao imperial e ao tremoço, à toalha e ao bronzeador, ao chinelo e ao colchão?"
"O que vem então a ser a filosofia, que deu os primeiros passos num clima estival como o nosso? Não é senão o estudo de problemas que podemos caracterizar como «conceptuais». A filosofia não é sociologia de café, nem psicologia especulativa, nem poesia em prosa. A filosofia ocupa-se de problemas para os quais não há métodos formais ou científicos de solução. [...]"
"Tomemos a ideia muito popular de que «tudo é relativo». A filosofia liberta-nos do dogmatismo que consiste em repetir sem pensar que tudo é relativo só porque está na moda pensar que tudo é relativo. A filosofia permite-nos dar um passo atrás e olhar criticamente para os nossos preconceitos culturais. Que razões temos para pensar que tudo é relativo? E são essas razões também elas relativas? [...]; a filosofia [devolve-nos] o gosto pelo pensamento sem peias, pela tentativa inelutável de resolver problemas, melhorar teorias, encontrar argumentos. O que se pode perfeitamente fazer à beira-mar, conversando com outro ser humano. Ao Sol."
Etiquetas: filosofia, palavras dos outros
3 Comments:
Obrigado pelas suas simpáticas palavras!
boa... vamos filosofar para a praia?
aliás gosto de ir para praia com amigos, pois é um sítio tão especial para se falar..
Com muito agrado! :)
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