Os "Lobos", os patriotas e os conformistas (II)
Uma das tendências da sociedade conformista em que vivemos é a prática de uma abordagem filosófica caracterizada pela negação de qualquer coisa e o seu contrário. O cinema de massas é insuportável, mas os filmes iranianos são uma chatice pegada. O Bairro Alto é decadente, mas as Docas são insuportáveis. A Margarida Rebelo Pinto é superficial, mas o Thomas Mann é uma maçada. No fundo, não há quaisquer valores referenciais, porque a perspectiva é sempre a do enfado, da depreciação, da relativização.
O patriotismo é um dos valores que mais sofre com este conformismo, o qual está sempre preparado a uma tirada de desdém ou a uma atitude de menosprezo. Mostrar respeito pela nação, assumir os valores da pátria e mostrar-se disposto a lutar por ela, na vida privada e social, tornou-se, na melhor das hipóteses, uma ideia kitsch, ingénua, tonta. Muitos não hesitariam em qualificá-la de disparatada, retrógrada ou mesmo absolutamente reaccionária.
Quando, portanto, vinte e tal homens de barba rija, muitos pesando mais de uma centena de quilos - tendo deixado provisoriamente os seus empregos em Portugal para competir num campeonato do mundo contra as melhores selecções do planeta - se dignam a representar a nação com enorme brio, chegando ao ponto de se emocionar a entoar o hino nacional, logo surgem reacções de desprezo e chacota (um exemplo aqui).
Não serão poucos os que, de forma anónima, viram naquele ritual uma demonstração de patriotismo bacoco. Os conformistas do costume terão rido, não duvido. Eu confesso que fiquei emocionado. Já me impressionara o facto de uma equipa de amadores ter conseguido chegar ao mundial de râguebi, e apreciara as declarações de jogadores e técnicos, que preferiram às tradicionais tiradas inócuas e egoístas das estrelas do futebol, destacar o espírito do grupo e essa conservadora e “reaccionária” ideia de que tudo fariam para honrar o nome de Portugal. Mas não esperava uma tão forte, genuína e corajosa demonstração de patriotismo, que se estendeu aliás ao relvado, onde Portugal combateu com bravura e surpreendeu os observadores estrangeiros (ver aqui, aqui e aqui).
Vamos perder os jogos todos? É provável. Ninguém se lembrará disso daqui a umas semanas, porque não seria de esperar nada de diferente. Mas aquela demonstração de patriotismo perdurará, teimosamente recordando os conformistas – os tais que desejam “uniões ibéricas”, esperam orientações “externas” ou simplesmente vivem da permanente desvalorização do que existe entre nós – que há quem não esteja adormecido.
:: Um excelente acompanhamento do Mundial de Râguebi, na Origem das Espécies, e amiúde no 31 da Armada e no Cachimbo de Magritte.
1 Comments:
A propósito de patriotismos, nacionalismos, fanatismos, e relacionados.
http://www.usatoday.com/
printedition/news/20070912/
a_amendment12.art.htm
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