Segue a polémica: círculos eleitorais
É um bom desafio, André, mas acho que não haverá um banho de sangue, pois estou de acordo contigo em alguns domínios. Um deles é a tua crítica ao sistema eleitoral presente. Eu também acho que não faz sentido a divisão em distritos como forma de ligar os deputados a um determinado interesse regional. E é aqui que nasce a minha objecção ao sistema “uninominal”, pois este conceito baseia-se num ideal de representação que dá primazia à proximidade entre eleitores e eleitos, responsabilizando estes últimos de uma forma mais clara perante os primeiros. Por outras palavras, o deputado eleito torna-se um representante de um eleitorado específico (o que os ingleses chamam “constituency”) e dos interesses singulares desse eleitorado.
Ora, este ideal depende de duas condições fundamentais – e nenhuma delas existe no nosso país. A primeira é a ideia de que existem interesses regionais e geográficos significativamente distintos, exigindo este quadro plural uma representação específica, sob pena de a política legislativa esquecer os interesses minoritários em prol dos “desígnios nacionais”. Ora, mesmo sendo evidente que existem diferenças entre as regiões e desigualdades geográficas no nosso país, elas não são de tal modo irreconciliáveis e vincadas, que exijam, no meu entender, uma representação específica. Por outro lado, essas diferenças não estão ligadas a necessidades completamente independentes das prioridades e dos interesses que existem nas outras regiões. Ou seja, no caso português, os problemas diferentes – e refiro-me às questões regionais – raramente exigem soluções diferentes. Não vejo necessidade, portanto, de cada região ter um representante que lute especificamente pelos seus interesses, quando estes coincidem, "grosso modo", com o resto do país.
O contrário acontece, por exemplo, nos Estados Unidos ou no Reino Unido, pois estes são países que, pela sua dimensão, pelas divergências históricas entre certas zonas, e pela dinâmica francamente singular de determinadas regiões, exigem uma representação particular. Em Portugal há uma unidade de interesses muito vincada e perante essa homogeneidade o ideal de uma representação de carácter “regional” perde muito do seu sentido (a excepção são as ilhas e não é por acaso que estas têm um parlamento próprio e uma autonomia reforçada).
A segunda condição é de que exista liberdade de voto entre os representantes. Só assim estes poderão defender adequadamente os interesses que representam, apreciando as leis de acordo com as necessidades específicas da região que os escolheu e do eleitorado perante o qual respondem. Mas em Portugal todos os partidos impõem a chamada “disciplina de voto”, que uniformiza a política em função das determinações ideológicas ou programáticas previamente delineadas. Nestes termos, os representantes desses interesses regionais teriam que optar por uma de duas problemáticas e destrutivas opções: ou seguir as orientações partidárias “nacionais” – e abdicar de representar os interesses particulares do seu eleitorado (o que destruiria o propósito do sistema); ou desafiar os partidos pelos quais foram eleitos, abrindo brechas graves na governação e nas fileiras partidárias, perdendo muito provavelmente as suas futuras hipóteses de reeleição.
Enquanto estes dois elementos não se verificarem no nosso país – a existência de diferenças e interesses regionais muito vincados e a prática de liberdade de voto no parlamento – o sistema uninominal, e em rigor o sistema actual “distrital”, são perfeitamente inúteis. Eu preferiria um sistema nacional simples, proporcional, mas com uma eleição directa dos representantes de acordo com o apuramento dos votos individualmente considerados. Este modelo não fecharia as portas aos independentes (que poderiam apresentar-se a um nível nacional e não apenas regional), nem aos partidos mais pequenos (que praticamente desapareceriam com o sistema “uninominal”), e constituiria uma excelente barreira contra os caciques locais.
:: No fim-de-semana prometo escrever sobre a questão do número de deputados.
Ora, este ideal depende de duas condições fundamentais – e nenhuma delas existe no nosso país. A primeira é a ideia de que existem interesses regionais e geográficos significativamente distintos, exigindo este quadro plural uma representação específica, sob pena de a política legislativa esquecer os interesses minoritários em prol dos “desígnios nacionais”. Ora, mesmo sendo evidente que existem diferenças entre as regiões e desigualdades geográficas no nosso país, elas não são de tal modo irreconciliáveis e vincadas, que exijam, no meu entender, uma representação específica. Por outro lado, essas diferenças não estão ligadas a necessidades completamente independentes das prioridades e dos interesses que existem nas outras regiões. Ou seja, no caso português, os problemas diferentes – e refiro-me às questões regionais – raramente exigem soluções diferentes. Não vejo necessidade, portanto, de cada região ter um representante que lute especificamente pelos seus interesses, quando estes coincidem, "grosso modo", com o resto do país.
O contrário acontece, por exemplo, nos Estados Unidos ou no Reino Unido, pois estes são países que, pela sua dimensão, pelas divergências históricas entre certas zonas, e pela dinâmica francamente singular de determinadas regiões, exigem uma representação particular. Em Portugal há uma unidade de interesses muito vincada e perante essa homogeneidade o ideal de uma representação de carácter “regional” perde muito do seu sentido (a excepção são as ilhas e não é por acaso que estas têm um parlamento próprio e uma autonomia reforçada).
A segunda condição é de que exista liberdade de voto entre os representantes. Só assim estes poderão defender adequadamente os interesses que representam, apreciando as leis de acordo com as necessidades específicas da região que os escolheu e do eleitorado perante o qual respondem. Mas em Portugal todos os partidos impõem a chamada “disciplina de voto”, que uniformiza a política em função das determinações ideológicas ou programáticas previamente delineadas. Nestes termos, os representantes desses interesses regionais teriam que optar por uma de duas problemáticas e destrutivas opções: ou seguir as orientações partidárias “nacionais” – e abdicar de representar os interesses particulares do seu eleitorado (o que destruiria o propósito do sistema); ou desafiar os partidos pelos quais foram eleitos, abrindo brechas graves na governação e nas fileiras partidárias, perdendo muito provavelmente as suas futuras hipóteses de reeleição.
Enquanto estes dois elementos não se verificarem no nosso país – a existência de diferenças e interesses regionais muito vincados e a prática de liberdade de voto no parlamento – o sistema uninominal, e em rigor o sistema actual “distrital”, são perfeitamente inúteis. Eu preferiria um sistema nacional simples, proporcional, mas com uma eleição directa dos representantes de acordo com o apuramento dos votos individualmente considerados. Este modelo não fecharia as portas aos independentes (que poderiam apresentar-se a um nível nacional e não apenas regional), nem aos partidos mais pequenos (que praticamente desapareceriam com o sistema “uninominal”), e constituiria uma excelente barreira contra os caciques locais.
:: No fim-de-semana prometo escrever sobre a questão do número de deputados.
1 Comments:
Ficamos a aguardar a continuação...
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