quinta-feira, setembro 18, 2008

Dostoievski e o tempo

Em 1873, no início da sua carreira de jornalista, Dostoievski publicou um discurso de um tal príncipe Mechtcherski no qual se inventariavam instruções do czar aos deputados, algo que a censura não permitia sem a devida licença prévia. Após julgamento sumário, foi condenado ao pagamento de uma multa e a 3 dias de prisão efectiva, que viria a cumprir no início do ano seguinte.

Conta a sua mulher Dostoievskaïa, em biografia que fez do marido, que o próprio Dostoievski cumpriu a pena com grande bom-humor, chegando a afirmar que até lhe tinha dado jeito. Acabou por ter um descanso da hiper-actividade dos filhos, e tendo por companheiro de cela um sujeito que não fazia senão dormir e nunca falava, pôde reler Os Miseráveis de Hugo, obra que muito admirava e que lhe dava jeito ter presente para trabalhos futuros.

No fundo, parece que por vezes a reclusão, mesmo que não auto-imposta, não é necessariamente coisa má: ela funciona como uma espécie de paralização do tempo do mundo, um só momento que permite à alma retomar fôlego. E que melhor maneira de fazer a alma reinspirar do que a (re)leitura dos clássicos?