sexta-feira, setembro 26, 2008

Mr Darcy, Elizabeth, Jane Austen, eu e a minha mulher

António Damásio, no âmbito das neurociências, tenta no seu último livro aplicar uma tese originariamente spinozana às funções e operações do cérebro, segundo a qual as emoções não podem ser contrariadas, controladas ou removidas pela razão ou pelo conhecimento que delas fazemos, mas apenas por outras emoções mais fortes que se lhes sobreponham. Isto significa que um amor sucedendo a um ódio prévio terá de ser mais forte que esse ódio, e provavelmente muito mais forte do que se não houvesse ódio prévio.

Em Pride and Prejudice, Mr Darcy e Elizabeth começam por detestar-se mutuamente: ele vê-a como simples e de beleza pouco estonteante, com uma família para a qual dirige um seu preconceito, o de assumir comportamentos rudes "em sociedade"; ela vê-o como um orgulhoso pedante que promove a antipatia social como ideal de vida em comum. Com o tempo, ambos contrariam estas emoções com emoções contrárias: ele vê-se conquistado pela beleza subtil dela que crê incomparável, e toma a sua simplicidade por virtude, eliminando assim os preconceitos anteriores; ela vê o orgulho dele como uma capa de protecção contra as suas fragilidades no âmbito da "sociedade", e a antipatia como mera consequência de uma inaptidão em lidar com os outros. Daí o seu amor mútuo no final parecer ser mais forte que o de todas as outras personagens, por ter sido precedido de um ódio prévio.

Tudo isto me soa demasiado familiar...