sexta-feira, novembro 30, 2007

A primeira polémica no Bem Pelo Contrário: círculos eleitorais e redução do Parlamento

Insurge-se o meu masterblogger contra os "remédios" dos círculos uninominais, acusando-os de iminente caducidade e fomentadores do caciquismo local ou regional. Num certo sentido, não deixa de ter razão.
Defende ainda expressamente a urgência e necessidade da redução do número de deputados, por razões de eficiência e diminuição de custos e inúteis privilégios. Num certo sentido, não deixa de ter razão.

Mas...
Não é completamente inadequado o sistema de eleições por círculos distritais plurinominais? O cidadão sabe que determinado sujeito é o número um da lista de um partido num distrito longínquo, e que no fundo esse mesmo sujeito é também, por ser presidente do seu partido, candidato a vir a formar governo; mas como concorre de longe, não se lhe pode votar. No caso português, José Sócrates, actual primeiro-ministro, foi convidado a formar governo tendo sido eleito pelo círculo de Castelo Branco: o que significa afinal que o primus inter pares do executivo português foi eleito apenas pelos albicastrenses. Onde está aqui a apregoada political legitimacy?: provavelmente, nowhere.
Como bem notará o meu masterblogger, isto não é defesa dos círculos uninominais. Estes são ainda dotados de um parecido defeito: que todos os que não votam no vencedor de um dado distrito, no fundo, votam para coisa nenhuma. Por outro lado, se os partidos deixarem de ter exclusividade no concurso para eleições parlamentares, a representação local legislativa torna-se alvo dos caciques, mas a responsabilidade de um dado representante face a determinados representados torna-se mais directa.
Por que não desenvolver então um razoável sistema misto uninominal regional-plurinominal nacional? Os caciques representariam só alguns e não todos, os eleitos por círculo nacional único representariam todos: e não haveria voto que se perdesse. E, bem congeminado, nem seria precisa uma dupla câmara.

Quanto à redução dos deputados: temos lá 230 perfeitas nulidades. Supondo que passam a ser 101. Ora, 230 perfeitas nulidades menos 129 perfeitas nulidades dá uma soma de 101 perfeitas nulidades. É que os 101 que sobreviverem estão com certeza já dentro dos 230 que lá estão. E mais: 230 representantes para cerca de 11 milhões de pessoas (emigrantes incluídos) não é muito. Diminuir o número de representantes não é aristocratizar ainda mais o regime?

Abre-se polémica...

a arte da fuga, 20

James Tissot, The Annunciation, 1895

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quinta-feira, novembro 29, 2007

Mudanças eleitorais

Eis um debate que, quando os tempos da política estão demasiado mornos, sempre dá à superfície. Os grandes partidos acenam com os “círculos uninominais”, panaceia para todos os males. Naturalmente, pouco lhes interessa que o esquema seja caduco (na Inglaterra, todos o amaldiçoam) e desadequado à realidade nacional. O que importa é agitar as hostes e prometer “maior proximidade com o povo”, slogan que gera simpatia junto dos mais incautos. Esquecem, claro, que a dita “proximidade” não augura nada de bom, pois apenas estimulará o caciquismo, os favorecimentos políticos e as manobras intriguistas de índole regional.

Ninguém quer discutir a verdadeira reforma – a que diz respeito à redução significativa do número de deputados, que traz vantagens ao nível da funcionalidade do parlamento, dos custos orçamentais e da eficácia do sistema – a única que realmente altera o status quo, mexendo com as regalias e alterando privilégios. Mas, naturalmente, não se pode esperar que um regime podre deseje alterar a sua própria podridão.

quarta-feira, novembro 28, 2007

Momentos mágicos




No dia 26 de Novembro de 1676, um jovem alemão desembarca na Haia durante o seu percurso de Paris para Hannover. A sua escala tem um intento específico: buscar e conhecer em pessoa um homem que há anos vem atormentando a sua maneira de pensar, nos métodos, nas ideias, no estilo de vida.


Instala-se numa qualquer albergaria, e só dois dias depois, dia 28, ganha coragem de se apresentar na casa do seu admirado. Bate à porta, nervoso. Quem lá habita abre a porta: já esperava a visita há alguns dias. Por troca de correspondência, anuíra em tornar-se anfitrião de um tal jovem de mente curiosa.


Nessa noite, jantam juntos. Nada de muito requintado na ementa, umas farinhas, umas frutas, algum vinho. Após a refeição, o anfitrião provavelmente acende o seu cachimbo, hábito que muito lhe apraz. O visitante acompanha-o.


Sabe-se que falam sobre a situação da política holandesa e o estado da política internacional. O anfitrião conta algumas das suas experiências pessoais junto da política, alguns anos antes. O visitado, impaciente, começa de bater o pé no chão, nervoso: nunca mais se discute o que ele pretende, Deus, ciência, a imortalidade da alma, a necessidade e a contingência...


Solícito, o anfitrião repara: deixa o visitado falar sobre o que quiser. Anui aqui ou ali, discorda ali ou aqui. Já teve muitos jovens batendo-lhe à porta, cheios de duvidanças. Mas repara que este parece mais inteligente que todos os outros. No final, o visitado retira-se, o anfitrião agradece a visita, predispõe-se a recebê-lo de novo no futuro, promete enviar-lhe um exemplar de um dos seus livros. Cumprimentam-se cordialmente.


Foi há 331 anos. O mais novo tinha por nome Gottfried Leibniz, 30 anos na altura, o mais velho Baruch Spinoza, 45 anos na altura.

Parece apenas que quando os dois génios mais luminosos de um mesmo século partilham um serão num mesmo aposento, todo o mundo (e o paraíso dele criado) parece bem mais pequeno.

"O futuro já começou"

terça-feira, novembro 27, 2007

No meio está a virtude

Poderá ser uma ideia fora de moda, mas talvez fosse bom reavaliar a importância de seguir uma política de moderação nas relações internacionais. Actualmente este campo é dominado por uma censurável dicotomia.

De um lado, vinga a postura extremista, desafiadora e agressiva de um Chávez, por exemplo, que prefere o insulto fácil à negociação complexa. Veja-se a polémica relativa à Colômbia, que serviu para novo número de circo que todavia apenas isola o polémico líder venezuelano cada vez mais.

Por outro lado, inúmeros países parecem adoptar apenas uma espécie de cinzento contraponto, caracterizado pela absoluta anuência perante as outras nações, numa atitude onde não raras vezes convivem uma estranha subserviência e uma irritante bajulação. Basta recordar o que tem sido a política externa do Governo de Sócrates nos últimos dois anos, que conseguiu a proeza de lisonjear George Bush, encomiar Putin e aplaudir Chávez, sempre com inenarráveis episódios pelo caminho, algures entre o fait-divers e a calinada linguística.

Nas relações internacionais desaconselham-se posturas provocatórias, pois estas inviabilizam a discussão e a obtenção de princípios de acordo fundamentais para preservar a paz nas diferentes regiões/continentes. Todavia, uma posição totalmente subalterna e diminuída, num clima de autêntico servilismo, em nada favorece esse necessário debate, que confronta ideias, interesses e ambições naturalmente distintas, permitindo assim esclarecer os pontos de confluência e as condições necessárias para alcançar compromissos.

O mundo só teria a ganhar se os líderes mundiais e os respectivos governos orientassem as relações internacionais segundo uma lógica de equilíbrio, em detrimento destes dois modelos extremistas, distintos no tom, mas semelhantes no insucesso que necessariamente acarretam.

segunda-feira, novembro 26, 2007

Publicidade (?)

Não é costume a presença de publicidade acriticada aqui no Bem Pelo Contrário.

Simplesmente, não consigo deixar de me surpreender pela presença do meu nome (mal escrito, como sempre) no meio deste rol de conferencistas anunciados. O programa é visível aqui.

o horizonte sensível, 6

Newcastle, 2003

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sábado, novembro 24, 2007

A autonomia do Ministério Público

O Procurador-Geral da República deu nova entrevista com recados ao Governo, desta vez avisando a inaceitabilidade de um diploma que faça dos funcionários do MP funcionários públicos. O MP não pode ser dependente do Governo, diz-se.

O MP tem autonomia, portanto. Os tribunais têm autonomia. E quem são o MP e os tribunais, afinal? Uns são órgãos de soberania, o outro é o representante do Estado na legalidade judicial. Mas as pessoas lá trabalhando ninguém sabe quem sejam...

Que não convém ter membros esquisitos do Governo a interferir nos meios de actuação do MP aceita-se convenientemente. Mas quando é que alguém se lembrará da necessidade de formação de um cargo judicial que seja elegível?

É que a autonomia em democracia é suposto pertencer só ao povo, que é o detentor da soberania. (Sim, os juízes não são soberanos, como já li muitos deles dizerem deles próprios, são apenas membros de órgãos de representação da soberania.) Querem um pouco dela? Peçam-na a quem a detém: tornem-se elegíveis.

Regresso a Anápolis

Em 1786, com apenas dez anos de independência, os Estados Unidos da América estavam à beira da desagregação. O país, governado de acordo com os Artigos da Confederação de 1781, caminhava em sentido divergente, sem uma política nacional eficaz. O Congresso dispunha de limitados poderes e revelava uma preocupante incapacidade para coordenar a política económica da nação. Não existia ainda a figura agregadora de um Presidente, nem de uma Administração federal, o que enfraquecia ainda mais a vacilanete União. As leis necessitavam de uma aprovação unânime por parte dos Estados, que preferiam ignorar os requisitos do Congresso e traçar de forma independente a sua própria política. A desintegração da União parecia, pois, um destino inexorável.

No entanto, um grupo de patriotas e unionistas convictos não desistiu e apelou aos diversos Estados para que fosse convocada uma conferência nacional nesse mesmo ano de 1786, para resolver o impasse em que mergulhara a União. A Conferência realizar-se-ia em Anápolis (Maryland), e teria como objectivo definir os novos contornos da política económica americana, conferindo reforçados poderes ao Congresso nesse domínio capital da nação.

A Conferência de Anápolis foi um rotundo fracasso. Compareceram apenas doze delegados, representando cinco Estados (de um total de treze). Todavia, os poucos que aí se encontravam tomaram uma decisão que iria mudar o rumo da história americana e mundial: redigiram uma nova convocatória aos Estados, requerendo que enviassem delegados a uma Convenção extraordinária, a ter lugar em Maio do ano seguinte. O objectivo desta Convenção seria, contudo, mais ambicioso do que a Conferência de Anápolis, pois os doze bravos resistentes de Anápolis indicavam explicitamente que era necessário “reconsiderar os Artigos da Confederação e tomar providências para tornar o governo federal adequado às exigências da União”. Estavam lançadas as bases para a Convenção de Filadélfia, que no verão de 1787 iria reedificar todo o sistema político americano, alicerçando-o numa Constituição que ainda hoje vigora.

A Administração Bush – talvez numa tentativa para se redimir dos seus falhanços na política externa – empenhou-se a fundo para que se realizasse nos próximos dias (ou semanas) uma conferência internacional em Anápolis. O objectivo é juntar à mesa das negociações israelitas, palestinianos e outros representantes árabes (Arábia Saudita, Síria, Egipto, etc.), além de grandes potências internacionais como a Rússia ou a China – e discutir o futuro do Médio-Oriente. Tal como há 221 anos, as perspectivas de sucesso eram frágeis – quase inexistentes. E no entanto, Anápolis foi um ponto de viragem e o anunciar de uma nova era para a América. Que a conferência de Anápolis dos nossos tempos possa ser igualmente um momento marcante, não apenas para os Estados Unidos, mas para o mundo em geral.

sexta-feira, novembro 23, 2007

Eu no meu mundo só meu (outra vez)

Leitor com assiduidade intermitente do Corta-Fitas, decidi votar no inquérito para "melhor colunista na imprensa portuguesa".

Mirei a lista, e fiquei satisfeito: desta vez, conheço a maior parte dos nomes lá colocados.

Quando me preparava para colocar o meu voto, hesitei: onde diabo estão os meus colunistas preferidos? Tenho três, e nenhum deles lá figura.

Anselmo Borges, António Lobo Antunes, e João Bénard da Costa. Claro.

Fica para a próxima, então.

quinta-feira, novembro 22, 2007

Há esperança

A democracia venezuelana

Decorria o programa diário do jornalista venezuelano Gustavo Azócar na Televisão Regional de Táchira quando a deputada Iris Varela, uma veemente aliada do Presidente Chávez, entrou no estúdio acusando-o de a ter difamado. Como Azócar não parecia ficar convencido, Varela passou à acção: esbofeteou o apresentador, partiu-lhe os óculos e destruiu parcialmente o cenário. Tudo em frente às câmaras de televisão. Bendita democracia.

quarta-feira, novembro 21, 2007

Duvidança Especial (21)

- Conseguirá o youtube conter a generalidade das minhas cenas cinematográficas preferidas?

O paradoxo

“O parlamento federal alemão aprovou uma nova lei que autoriza o Estado a gravar e arquivar durante seis meses conversas telefónicas, mensagens de faxe e acessos à Internet, incluindo «mails». O Governo justifica esta medida com a necessidade de combater a criminalidade organizada, e de fazer abortar a tempo conspirações criminosas, nomeadamente terroristas. Jornalistas, médicos ou advogados serão também atingidos por este apertado sistema de vigilância.” ("Expresso", Primeiro Caderno, p. 31; sem link).

Eis mais um passo para tornar o pesadelo de Orwell uma estranha realidade. Facto especialmente perplexo se considerarmos a repulsa alemã pelo passado nazi e pela experiência da RDA, dois regimes assentes justamente no controlo dos mais variados comportamentos dos indivíduos (quer na sua dimensão social, política, religiosa, familiar, etc.). Por outro lado, esta quase obsessiva necessidade de catalogar todo o género de aspectos ligados à privacidade dos cidadãos – sob o pretexto de evitar atentados terroristas num país onde estes não ocorrem há trinta anos – é infelizmente um produto para exportação, pois os regimes modernos olham-no como uma panaceia para todos os males.

É hoje consensual que estes mecanismos são essenciais para garantir a segurança dos cidadãos e permitir que estes vivam plenamente em liberdade. Considera-se que os direitos individuais só podem ser protegidos limitando os direitos individuais. Entende-se que só existe liberdade se restringirmos a liberdade.

Preocupa-me que se aceitem estas doutrinas sem reconhecer que elas se fundamentam numa enorme falácia e num inaceitável paradoxo.

segunda-feira, novembro 19, 2007

Uma história alternativa

Sabemos como aconteceu, desde o desenvolvimento das primeiras civilizações ao surgimento do Cristianismo, desde as invasões bárbaras ao triunfo da informática. Mas... poderia ter sido de outro modo? É possível fantasiar que a História – uma extraordinária sucessão de eventos que não é mais que um afortunado jogo de acasos – tivesse sido escrita com uma pena diferente?

É este o ponto de partida de What If?, uma pechincha que comprei num alfarrabista em Londres (no caso, o segundo volume). Um conjunto de reputados historiadores reflecte sobre o modo como o mundo teria evoluído se pequenos eventos tivessem alterado os grandes acontecimentos da narrativa humana. Os sugestivos títulos dos capítulos falam por si: “Os chineses descobrem o Novo Mundo no século XV”; “Lutero morre na fogueira em 1521”; “Se Lincoln não tivesse libertado os escravos”; “O Führer à solta (Hitler sobrevive à ofensiva aliada)”.

Nestes ensaios de história contrafactual destacam-se dois textos. O primeiro parte da hipótese de Sócrates ter morrido na Batalha de Délio, onde os atenienses foram esmagados, mas o (ainda jovem) filósofo sobreviveu. As páginas que se seguem consideram o futuro da filosofia sem um dos seus pais fundadores: o que teria sucedido a Platão, sem nunca ter conhecido o seu mentor? Que rumo teria seguido a educação dos jovens atenienses, sem que os sofistas tivessem um rival à altura? E o que seria da tradição ocidental sem os diálogos platónicos, sem o Fédon ou o Górgias, sem A Apologia de Sócrates ou A República?

O terceiro artigo é igualmente extraordinário, a começar pelo título: “Pôncio Pilatos poupa Jesus”. Seria possível um Cristianismo sem a crucificação? “E se Cristo tivesse vivido uma vida muito longa?”, pergunta Carlos Eire. Teria um velho e cansado profeta ainda assim cativado as multidões? Sem essa grande epifania, teriam os cristãos minado os alicerces do Império Romano? Haveria sequer um Cristianismo? E se não, o que seria da nossa história moderna, sem igrejas e sem papas, sem a Páscoa e sem o Natal? O autor responde a estas e outras questões impossíveis com uma difícil mas notável combinação de humor e densidade especulativa, no melhor texto de um grande livro.

sábado, novembro 17, 2007

O melhor parágrafo do fim-de-semana

"Depois de tratar dos fumadores, o grupo parlamentar do PS propõe-se agora tratar da saúde a quem abusa do sal. Há um deputado que anda entusiasmado a preparar uma lei que vai regulamentar ao decigrama o teor máximo de sal permitido nos alimentos dos restaurantes. [...] Eu sempre disse: primeiro o tabaco, depois o sal, a seguir o álcool, depois as gorduras e os fritos e a seguir, quem sabe, talvez saia uma lei a regulamentar o perigo que representa para a nossa saúde o facto de ainda estarmos vivos."
[Miguel Sousa Tavares, no "Expresso".]

sexta-feira, novembro 16, 2007

Do que é prioritário (IV)

Binya, jogador do Benfica, fez uma falta muito grave durante um jogo da Liga dos Campeões. Foi expulso, e, mesmo arrependido ulteriormente, foi castigado pela UEFA em seis jogos. Isto significa que para a UEFA um jogador que comete uma falta grave no decorrer de uma partida é mais culpado e gravoso que um treinador de futebol que agride um jogador adversário no final de uma partida (seis jogos de castigo para Binya, quatro para Scolari). Onde está o fair play, mesmo?

Do que é prioritário (III)

Que nos interessa que a economia portuguesa cresça 1,8% se todos os outros crescem 2, 3, 5 ou 10%? Que entusiasmo pode existir no anúncio de que continuamos em último e cada vez mais longe dos outros concorrentes?

Do que é prioritário (II)

Num dos debates sobre o Orçamento ouvi uma dezena de deputados pedirem a palavra para defenderem a sua honra. Mas não ouvi nenhum pedir a palavra para defender o interesse público, e muito poucos se lhe referiram quando dela fizeram uso.

Do que é prioritário (I)

Ouço as pessoas queixarem-se do modo como são mal atendidas nos serviços públicos. “Foram muito antipáticos”, dizem. Pouco me importa que sejam simpáticos ou antipáticos – respondo – desde que sejam eficientes.

quinta-feira, novembro 15, 2007

O meu episódio "Gabriel Alves"

Quando caloiro na faculdade, logo na primeira semana de aulas, alunos ainda pouco conhecendo-se, alguém sentado na primeira fila do auditório, enfadado com os dizeres do professor (mal sabia eu que seria um fado do curso), decidiu redigir uma lista de famosos e divertidos dizeres do inenarrável Gabriel Alves.

Contente com o seu feito, ambicionou partilhá-lo, e portanto vai de fazer passar a sua folhinha de mão em mão, por cada colega sentado ao longo do auditório. Eu próprio li a coisa e achei um piadão, mesmo conhecendo já a maior parte daqueles ditos de sabedoria.

Uma semana depois, ficámos a saber que a Raquel, aquela rapariga loira que se sentava na segunda fila, não tinha o apelido Alves por acaso. É a filha do dito Gabriel...

Coisas que fazem rir, 19

Uma excelente imitação do grande Gabriel Alves, a recordar inesquecíveis pérolas...

quarta-feira, novembro 14, 2007

Devagar, devagarinho... parados

O movimento Cidadãos por Lisboa propôs que fossem criadas certas zonas onde os automóveis não pudessem circular a mais de 30 km/h. Trata-se de uma proposta despropositada e demagógica, que aproveita as recentes tragédias nas estradas portuguesas (e na Grande Lisboa em particular) para contar com o apoio da opinião pública.

A proposta é errada quer nos seus pressupostos quer nas suas eventuais consequências. Em primeiro lugar, porque, ao associar-se aos recentes acontecimentos, sugere implicitamente que o limite legal em vigor (50 km/h) é excessivo e que é causa directa de acidentes rodoviários envolvendo peões. Isto é falso. Como é evidente, estes acidentes não aconteceram porque os automóveis circulavam a 50 km/h, nem a 60, nem a 70. A esmagadora maioria dos atropelamentos nas cidades sucedem quando os automobilistas seguem a altas velocidades, não tendo tempo para parar quando as pessoas atravessam a estrada (em passadeiras ou fora delas). E não é porque o limite legal esteja fixado em 50 km/h ou em 30km/h que estes condutores irresponsáveis vão abrandar, porque viajam já em condições de absoluta ilegalidade.

Por outro lado, se a proposta não diminuiria em nada os actos prevaricadores destes inveterados aceleras, levaria certamente ao caos absoluto nas estradas das nossas cidades. Qualquer pessoa que já pegou num volante sabe que uma velocidade inferior a 30 km/h é um desafio à perícia do condutor – para já não dizer à sua paciência. Manter um carro em movimento a essa velocidade é a negação do próprio conceito de veículo motorizado: a possibilidade de nos deslocarmos mais depressa do que se o fizéssemos a pé. As estradas continuariam repletas – porque a vida moderna é impensável sem automóveis – mas a cidade ficaria transformada numa espécie de filme em câmara lenta. E aposto como os acidentes seriam provavelmente menos violentos, mas certamente muito mais abundantes.

terça-feira, novembro 13, 2007

E também acredita no Pai Natal

Justiça é dar a cada um o que merece (suum cuique tribuere)

Noticiado pelo DN, o Ministério da Justiça comprou recentemente cinco automóveis novos "topo de gama". E tem ainda este jornal o desplante de explanar aquele tom de "vejam lá a vergonha, em tempos de contenção orçamental, andam a gastar o nosso dinheirinho em coisas supérfluas".

Mas não tem o ministro toda a legitimidade para o fazer? Ponham-se na sua posição: como pensariam?: certamente, "já que tenho de governar a corja, ao menos que tenha a possibilidade de andar por aí a abrir sem ser mandado parar pela polícia..."

segunda-feira, novembro 12, 2007

Duvidanças de uma mente curiosa, 72

A propósito de sucedâneos neste fim-de-semana:

1) Parece que, mais de trinta anos passados sobre a restauração da monarquia espanhola, o rei Juan Carlos tomou a sua primeira medida política relevante: virou-se para Hugo Chávez e perguntou "¿Por que no te callas?" Mas não dá vontade de perguntar ao rei Juan Carlos "¿Por que no hablas más?"

2) Parece que Hugo Chávez foi mandado calar pelo rei por estar a interromper o primeiro-ministro espanhol, qualificando o antecessor deste de "fascista". Mas o que é ser fascista hoje? Será que é ser fascista não respeitar a constituição do próprio país em proveito seu, não respeitar os direitos humanos reconhecidos no mundo ocidental, não gostar da liberdade de opinião, insultar países outros que nunca nos foram hostis, ser amigo de dirigentes políticos islâmicos que são fervorosos adeptos do holocausto? Aznar é fascista, aceito. O que é Hugo Chávez, mesmo?

3) Em Madrid, grupos de extrema-direita manifestaram-se na rua, tendo sido abordados por grupos de extrema-esquerda. Seguiu-se bordoada até mais não, e até morreu um jovem. Nos "noticiários" televisivos, identificavam-nos como grupos "neo-nazis" e grupos "antifascistas". Uns manifestavam-se contra o bem-estar de judeus, negros e imigrantes; outros bordoaram o manifestar dos primeiros. Dá azo a que se peça a todos: levante o braço quem não seja fascista...

4) Saindo do fascismo e do antifascismo: que diabo de fim-de-semana desportivo foi este? O Sporting a ser goleado, o Porto a empatar depois de uma vantagem de dois golos, o Benfica a golear, a bater a "fabulosa" "academia" de juniores do Sporting, a bater o Porto em andebol... Terá sido realidade?

A Esquerda revela-se

Nos últimos anos, comunistas e partidários da extrema-esquerda têm-se empenhado na construção de uma imagem mais moderada, procurando apresentar-se como forças credíveis, defensores dos trabalhadores, da paz e dos direitos sociais – temas que naturalmente agradam à maioria da população. Este marketing político vive também naturalmente daquilo que se oculta, e a Esquerda radical tem evitado ao máximo pronunciar-se sobre os seus ideais políticos mais extremados (a difícil relação com a liberdade religiosa e a liberdade de imprensa; a crítica aos compromissos internacionais, nomeadamente ao projecto europeu; o horror ao multipartidarismo).

Aos poucos vai-se criando a ideia de que a Esquerda radical mudou, tendo abandonado a visão comunista e trotskista do passado, e reconhecido os princípios basilares do pluralismo democrático. Nada mais falso. Por estes dias, e a propósito da comemoração dos 90 anos da Revolução Russa e dos 18 anos da queda do Muro de Berlim, comunistas e bloquistas baixaram as defesas e deixaram cair a máscara. A Esquerda radical revela por fim a sua verdadeira identidade. Deixo-vos três interessantes exemplos (sublinhados meus):

1. Manuel Gusmão, dirigente do PCP: “A grande revolução [Russa] [...] entrega o poder àqueles que sempre dele tinham sido afastados e o tinham apenas sofrido, começa a construir um sistema político que une as dimensões representativa e participativa da democracia [...]. a revolução leva à escrita povos que a não tinham [...], cria as condições do desenvolvimento científico e abre as portas a um florescimento artístico e cultural incomparável.”

“A revolução de Outubro é odiada porque ela continua a indicar o caminho, continua a significar que existe uma alternativa à barbárie capitalista, o socialismo e o comunismo. A Revolução de Outubro de 1917 continua a dizer-nos que um outro mundo será possível, na liberdade e na democracia, na justiça e no bem-estar social, com o poder dos trabalhadores e a emancipação social, com a criação cultural socialmente apropriada, com o socialismo.”

2. Miguel Portas, dirigente do Bloco de Esquerda, acerca do mesmo tema: “o «socialismo real» representou, nas condições históricas e geográficas assinaladas, o modo como a Oriente se concretizou o Contrato Social que ainda hoje marca a nossa História a Ocidente. Foi o modo como, em condições de subdesenvolvimento, se processou o salto para a Modernidade.”

3. Correia da Fonseca, dirigente do PCP, sobre o Muro de Berlim: “[Em 1961] Berlim era, pois, a um tempo, canal de hemorragia e via de livre infecção, e isto em plena situação do que se chamou Guerra Fria. Para estancar a hemorragia e travar a infecção foi erguida uma barreira que permitisse controlar entradas e saídas. Ficou conhecida como o Muro de Berlim e foi levantada a 13 de Agosto de 61. [...] o Muro foi o recurso possível para que um Estado internacionalmente reconhecido, a República Democrática Alemã, pudesse defender-se de uma permanente invasão «branca» e de um constante fluxo de emigração ilegal.”

Estas pessoas existem. Nem décadas de violência, nem os milhões de execuções bárbaras ordenadas por Estaline, nem a corrupção dos regimes comunistas – onde não havia lugar para a liberdade de expressão, de imprensa, de consciência e de movimento, onde não havia lugar para a oposição democrática ou para a crítica, onde não havia lugar para eleições livres, nem para o multipartidarismo, onde se praticava a tortura e a expropriação arbitrária, onde existiam julgamentos sumários sem o reconhecimento dos direitos jurídicos básicos, e onde triunfou a miséria e a pobreza – nada disto os comove. É bom conhecer a verdadeira natureza dos comunistas e da extrema-esquerda portuguesa.

:: Ver também os textos de Daniel Oliveira (“o que aquela revolução provocou em todo o Planeta foi qualquer coisa de absolutamente inédito na história da humanidade. [...] celebro aqui hoje esse momento em que tudo pareceu possível e o que essa simples esperança fez pela dignidade de milhões de homens e mulheres em todo o planeta.”) e de Vítor Dias (“a substituição do capitalismo pelo socialismo [...], continua inscrita como uma possibilidade real e como a mais sólida perspectiva de evolução da humanidade.").

domingo, novembro 11, 2007

a arte da fuga, 19

André Derin, Charing Cross Bridge, 1906

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sábado, novembro 10, 2007

Preguiça crítica

A discussão política em Portugal entrou numa prolongada hibernação. A esmagadora maioria dos jornalistas, opinion-makers e comentadores em geral esquiva-se a reflexões demoradas, preferindo avançar com análises sucintas e soundbytes (adoptando a mesma estratégia que criticam nos políticos). Vejamos: o PSD “está mergulhado numa crise” e tem “uma direcção bicéfala” (esta é particularmente irritante). A subida nas sondagens e as primeiras semanas surpreendentemente positivas e contidas de Menezes não são tidas em conta. O CDS está “ainda a recuperar das suas querelas internas”. Longa convalescença, esta! O país “atravessa um momento difícil” (mas alguma vez esteve num “momento fácil”?) e este é “o Orçamento possível” (não há alternativas, é isso? Então para quê o debate?).

Por outro lado, escasseiam as análises sobre as incongruências deste Governo, dito socialista. Poucas ou nenhumas perguntas sobre a falta de preocupações sociais do dito; pouca ou nenhuma insistência na falta de vergonha de um Governo que não honra os seus compromissos (o referendo, a não-subida de impostos, a subida de impostos “temporária”, os 150 mil empregos); pouca ou nenhuma insistência nos constantes erros, desvarios e ziguezagues estratégicos do Executivo.

As consequências estão à vista, mas é mais difícil traçar as causas: esta preguiça é fruto de um alinhamento político ou de uma letargia explicável talvez pelo clima ameno?

quinta-feira, novembro 08, 2007

O retrato do país

Os debates na Assembleia da República sobre o Orçamento espelham bem o estado decadente e patético em que se encontra mergulhada a política na nossa insípida nação. Do lado do Governo, assistimos a uma demonstração de autoridade desmedida, onde convivem a arrogância, a zombaria e o total desprezo pelo debate democrático. A oposição é tratada com desdém e mesquinhez, não hesitando ministros e secretários de Estado em recorrer a truques baixos e ataques pessoais, utilizando a sua posição de poder para escarnecer dos adversários. Uma autêntica feira de vaidades, um circo de presunção.

Do lado oposto assistimos a verdadeiros momentos de regabofe institucional. O líder de uma bancada parlamentar chama “aldrabão” a um ministro, para em seguida se ausentar de uma sessão plenária sem dar cavaco a ninguém. O presidente de um partido recorre permanentemente a slogans inócuos, numa espécie de política pronta-a-usar. Deputados de todas as cores políticas traçam cenários catastrofistas, a que os responsáveis do Governo respondem com descrições utópicas. É um triste espectáculo, num ambiente histérico, ideologicamente vazio, politicamente degradante, onde abundam os oportunistas e os demagogos. Para onde caminha a política?

Prodígios

É por estas e por outras que o Da Literatura merece uma visita diária:

“Salvo jornalistas da área cultural que têm de fazer o seu trabalho, acho sempre extraordinária a quantidade de pessoas que trabalham pelo menos oito horas por dia, e ainda têm que levar e trazer os filhos dos colégios, do karaté e do British Council, ir ao ginásio duas vezes por semana e, em muitos casos, manter o blogue actualizado, sem contar com seminários, conferências e jantares a que não podem faltar, acho extraordinário, dizia, que essas pessoas arranjem tempo para ler romances de 700 páginas num abrir e fechar de olhos.”

Diga-se de passagem que isto se aplica aos leitores, mas também aos escritores. Aliás, há por aí um jornalista que chefiou a informação de um canal generalista, apresenta telejornais todos os dias, faz reportagens no estrangeiro, orienta debates semanalmente, escreve crónicas com regularidade, e mesmo assim tem tempo para escrever livros de 600 páginas em quatro meses.

quarta-feira, novembro 07, 2007

o horizonte sensível, 5

Madrid, 2007

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terça-feira, novembro 06, 2007

E já agora, também um postalinho de boas festas

Luís Figo, jogador de futebol multimilionário que se lesionou num jogo do passado fim-de-semana, será hoje operado a uma coisa chamada "perónio", que os jornalistas desportivos tratam bem familiarmente, como se todos soubéssemos o que seja.
Muito solícito, o senhor Presidente da República enviou-lhe uma mensagem de apoio.

Acho bem. Se o presidente não servir para desejar as melhoras aos seus concidadãos, para que mais servirá? Anuncia-se portanto um volume anormal de correio a todos os hospitais deste país.

Adendando: no mesmo dia, o senhor Presidente da República enviou mensagens de apoio às famílias das vítimas do acidente na A23. Também acho bem: ponha-se o que tem valor igual num estatuto igual. De facto, a "fractura múltipla no perónio" do jogador Luís Figo é tão ou mais grave que a morte de 15 pessoas...

A Queda do Império

Li no fim-de-semana o Courrier Internacional. Gostei especialmente de um artigo de Dmitri Gubin, sobre essa doença dos tempos modernos – o “glamour” – que o autor define como “o testemunho de uma sociedade em que o sexo é a pouco e pouco substituído pelo sexy, ou seja, em que a imagem da acção substitui a acção em si”. Teria dificuldades em sintetizar melhor este vírus social, que transforma o simulacro em realidade opressiva, anulando todas as outras formas de existência social e negando a possibilidade de estas surgirem como modelos de autenticidade.

Verdadeiramente notáveis são os seguintes excertos do artigo, onde a um arguto pessimismo se junta uma fina ironia: “Há alguns anos, tive oportunidade de trabalhar numa revista cheia de «glamour». Ao princípio, o «glamour», com todas as suas regras [...] pareceu-me uma verdade da vida. Depois, tomei-o por um sonho. Agora, vejo nele um indicador muito prático: quantos mais Bentley com os volantes incrustados de diamantes houver na Rússia [e acrescento eu: em todo o lado], mais elevada será a taxa de mentira e menos provável será o risco de derramamento de sangue.”

Se a mentira e o luxo que a acompanha ultrapassarem os limites, teremos o destino da Roma Antiga, cuja civilização caiu por terra face a uma nova religião desprendida dos bens materiais. Não seria a pior saída. Claro que pereceríamos, mas, pelo menos, o fim da nossa civilização seria tema de centenas de filmes.”

Como me tenho sentido nestes dias

O Estado de Direito é uma chatice

Musharraf tem muita razão quando diz que não pode ficar de braços cruzados ao ver o seu país afundar-se por uma iminente decisão judicial. Afinal, a lei é de quem a faz ou de quem a aplica?

A lição que qualquer governante pode daqui retirar é óbvia: se os juízes não decidem a teu favor, manda prendê-los antes que prendam a ti...

segunda-feira, novembro 05, 2007

(Re)ver Bergman

(Persona, com Bibi Andersson e Liv Ullmann)
Durante o mês de Novembro a Cinemateca vai exibir uma série de filmes do grande mestre sueco. Excelente oportunidade para ver "Um Verão de Amor" (1951), "O Sétimo Selo" (1959), "A Fonte da Virgem" (1959), "O Silêncio" (1963), "Persona" (1966), entre outros.

Destacaria especialmente "Morangos Silvestres" (1957), obra notável sobre a memória e o tempo, em que um professor reformado (interpretação fabulosa de Victor Sjöstrom) se confronta com a sua juventude, assaltado pelos sonhos, dilemas e fantasmas do passado.

"Sonata de Outono" (1978) é uma outra obra memorável, que se centra no doloroso e antagónico encontro de uma famosa pianista (Ingrid Bergman, num magnífico papel) com a inábil filha (Liv Ullmann). A cena em que a mãe interpreta uma peça de Chopin (depois de uma actuação desastrada da filha), com a câmara a centrar-se no rosto amargurado e simultaneamente atormentado de Liv Ullmann é uma das mais extraordinárias de todo o cinema de Ingmar Bergman.

:: A programação pode ser consultada aqui. Bilhetes a 2,50 euros, na Rua Barata Salgueiro, 39.

sábado, novembro 03, 2007

Coisas que fazem rir, 18

Mais um exemplo da "peculiaridade lusitana".

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sexta-feira, novembro 02, 2007

Avanços e recuos (II)

O pior de tudo é que esta suposta alteração no "Estatuto do Aluno" não passa disso mesmo: uma ligeira correcção que não modifica o essencial. Ao remeter para os conselhos directivos a decisão de reprovar o aluno por excesso de faltas (e apenas em última instância), a nova lei insiste nos mesmos erros: desautoriza o Professor (que nada pode fazer perante um aluno que pura e simplesmente se está nas tintas para as aulas), desresponsabiliza o aluno e convida-o ao absentismo (pois sente que não existem consequências directas e imediatas para as suas faltas) e lança a batata quente nas mãos de um órgão que não pode tomar uma decisão racional (pois não sabe nem pode saber os verdadeiros motivos das faltas).

A nova lei limita-se a criar um labirinto burocrático para o qual toda a gente é convocada (pais, alunos, conselhos directivos, professores, encarregados de educação) mas onde ninguém sabe realmente que papel desempenha. Foi pior a emenda que o soneto.

Avanços e recuos (I)

O Governo recuou em relação ao novo “Estatuto do Aluno”, readmitindo a possibilidade de os alunos reprovarem por excesso de faltas. É um novo estilo de governação: atira-se o barro à parede a ver se cola. O PS começa por anunciar um qualquer delírio legislativo, apoiado por uma boa propaganda. Se não se levantarem ondas, o processo segue o seu caminho. Caso contrário, mudam-se umas alíneas e o Governo sai sempre vencedor, apregoando a sua “tolerância” e “bom senso”, para gáudio de alguns jornalistas seguidistas, que logo elogiam o “sentido de responsabilidade” de Sócrates e companhia.

Foi assim com a Ota, com a “reorganização das polícias”, com as doações aos familiares até 500 euros, que deviam ser declaradas ao fisco (uma das propostas mais absurdas de que há memória), com o “Estatuto do Aluno”, já para não falar do “prometemos não subir os impostos mas aguentem lá um bocadinho até 2007/2008/2009 (riscar o que não interessa)”. Só um Governo à deriva é capaz de tantos ziguezagues, de tantos avanços e recuos.

quinta-feira, novembro 01, 2007

Más companhias

O sucesso do projecto europeu até aqui deve-se aos valores que o fundamentam: o respeito incondicional pelo indivíduo e pelos direitos humanos; a preferência da conciliação e da diplomacia ao uso da força; a preservação da paz; a defesa da liberdade de expressão, de imprensa e de consciência; o pluralismo democrático e o Estado de Direito.

Ora, tudo isto é posto em causa quando se prepara uma cimeira que pretende reunir os chefes de Estado europeus e africanos, sem considerar a necessidade de definir quem deve participar. Talvez por estar obcecada com o politicamente correcto, a União Europeia teme adoptar esses “limites artificiais”. Trata-se de um erro.

A UE não deve ter receio em barrar a participação de chefes de Estado africanos que têm violado de forma sistemática aqueles valores. A UE não pode ser conivente com regimes que desprezam os direitos humanos, a democracia, a liberdade religiosa, a diversidade étnica, e que fazem da guerra um instrumento vulgar para obterem dividendos políticos e económicos. A UE não pode tolerar a barbárie instituída por facínoras como Mugabe, Khadafi, Al-Bashir e outros ditadores. Sob pena de menosprezar os seus próprios valores e de corroer os alicerces morais que a fundamentam.

:: Ver este site, com uma lista de ditadores africanos. E ainda os textos de uma série do Pedro Correia no Corta-Fitas sobre a vinda destes senhores a Lisboa (aqui e aqui).