quinta-feira, janeiro 31, 2008

Sherlock Holmes e o Homem Perfeito

No blogue Bomba Inteligente diz-se que Sherlock Holmes é o Homem Perfeito (com maiúsculas) pela sua elegância revelada em The Boscombe Valley Mystery. Mas logo no conto seguinte das Aventuras de Sherlock Holmes, intitulado The Five Orange Pips, Watson relembra um documento que havia escrito descrevendo o seu amigo Holmes:

«'It was a singular document. Philosophy, astronomy, and politics were marked at zero, I remember. Botany variable, geology profound as regards the mudstains from any region within fifty miles of town, chemistry eccentric, anatomy unsystematic, sensational literature and crime records unique, violin player, boxer, swordsman, lawyer, and self-poisoner by cocaine and tobacco. Those, I think, were the main points of my analysis.' Holmes grinned at the last item.»

Se este é o homem perfeito (mesmo assim, com minúsculas), vou ali e já venho...

quarta-feira, janeiro 30, 2008

Como me tenho sentido por estes dias

Em La Peste, Albert Camus apresenta-nos uma personagem escrevendo um romance, cuja primeira frase descreve uma amazona trotando a cavalo. Esta personagem, Grand, na permanente insatisfação com o produto material do seu trabalho imaterial, passa todo o tempo reescrevendo essa mesma primeira frase, pelo que são inúmeras as maneiras pelas quais a amazona vai trotando.

No final, Grand morre de peste sem nunca ter escrito mais que apenas a primeira frase do seu romance...

Não se enganaram no Pinto Ribeiro?

Como bem aponta o 31 da Armada aqui, dizer que Pinto Ribeiro assumirá a pasta da cultura é, para quem acompanha as coisas da cultura, dizer que António Pinto Ribeiro será ministro da cultura. Nunca é dizer que José António Pinto Ribeiro será ministro da cultura.

Reconhecem-se a José António Pinto Ribeiro grandes competências nas áreas do direito comercial e mesmo do direito penal. Quanto à cultura: bem, o homem queria ser ministro e aquele era o cargo vago... Que remédio!

Florida

Mais uma notável vitória para McCain (36%); mais um frustrante segundo lugar para Romney (31). Conquistando todos os delegados do Estado, McCain torna-se agora o líder no campo Republicano e parte como favorito para a Super Terça-Feira. Sendo próximo dos Democratas em temas sociais e económicos, McCain é odiado pela base conservadora do Partido Republicano. Em 2000, perdeu para Bush e tem sido muito crítico desta Administração (com excepção à Guerra do Iraque, que apoia). No fim de Janeiro, é o candidato melhor posicionado para conquistar a nomeação Republicana. A política tem destas ironias.

Huckabee ficou-se pelos 13% e a sua campanha está ferida de morte. Giuliani obteve um resultado patético (15%) e perdeu a corrida. Deverá desistir nos próximos dias, para se dedicar a reflectir na estratégia absurda que adoptou. Romney já investiu milhões de dólares na sua campanha, mas não consegue descolar nas sondagens em Estados fundamentais como a Califórnia e Nova Iorque. Precisa de novo fôlego durante os próximos dias, ou arrisca-se a perder definitivamente para McCain.

Entre os Democratas, a votação não interessava para as contas finais, mas Hillary Clinton aproveitou a ocasião para fazer uma figura ridícula: apresentou-se no Estado cantando vitória (que realmente obteve), apesar de todos os candidatos se terem comprometido a não fazer campanha nem a elaborar apreciações políticas dos resultados. Clinton não só quebrou esta última regra (descreveu os resultados como “um voto de confiança”), como pediu ainda que o Partido permitisse que os votos fossem considerados para a nomeação. Se isto não é um sinal de desespero, parece.

terça-feira, janeiro 29, 2008

Muda-se para ficar tudo na mesma

A saída de Isabel Pires de Lima não surpreende ninguém. Várias vezes desautorizada por Sócrates e Cavaco Silva, insistindo em declarações arrogantes e comportamentos erráticos, Pires de Lima cedo cavou a sua sepultura. Mas desenganem-se os mais optimistas: Portugal não tem uma política de cultura há décadas (se é que alguma vez a teve). Sai uma figura incompetente, mas os obstáculos de fundo subsistem.

Adivinhava-se igualmente a saída de Correia de Campos, dada a recente pressão da comunicação social e o desnorte revelado pelo próprio ministro. Estranho até que este não tenha invocado problemas de saúde para pedir a demissão – tantas entrevistas em tão curto espaço de tempo devem causar danos irreversíveis ao sistema nervoso.

Há muita gente que ficará satisfeita, mas, mais uma vez, é cedo para lançar foguetes. A substituta, Ana Jorge, já expressou admiração pelos ideais do seu predecessor (aqui), e não é crível que haja uma mudança de política na saúde. Sócrates sabe que mais um recuo iria abalar em definitivo a sua imagem de “político reformista”. E sem esse mito, Sócrates não pode ganhar as eleições de 2009.

Primárias na Florida

O “Sunshine State” vai hoje a votos. Porque se trata de um Estado com grande peso demográfico, esta poderá ser uma eleição importante. Tanto mais se tivermos em conta que na Florida existe o sistema de “o-vencedor-leva-tudo” (para os Republicanos); ou seja, quem obtiver a maior votação conquista todos os delegados. Isto significa que uma vitória na Florida permite obter quase tantos delegados de uma só vez como todos aqueles conquistados até aqui nas seis votações anteriores por Mitt Romney, que lidera o campo Republicano.

Com Giuliani a afundar-se cada vez mais e Huckabee em dificuldades (a sua campanha está literalmente sem dinheiro e conta com poucos apoios no partido), as atenções estão viradas para o duelo entre McCain e Romney. O primeiro é muito popular entre os moderados, enquanto os conservadores apoiam preferencialmente o segundo. As últimas sondagens apontam para um empate técnico.

À semelhança do que aconteceu no Michigan, as Primárias Democratas na Florida são na prática irrelevantes. O Estado quebrou as regras do Partido antecipando a data da votação, pelo que os resultados não serão tidos em conta para a escolha final do candidato.

:: Última sondagem (Rasmussen): McCain (31%), Romney (31), Giuliani (16), Huckabee (11).

segunda-feira, janeiro 28, 2008

ASAE: kill the messenger

Corre por aí um furor a propósito do excesso de zelo de uma instituição fiscalizadora de actividades comerciais de restauração. Um excesso de zelo só comparável ao da antiga PVDE/PIDE-DGS, polícia política de métodos duvidosos. Consta que essa tal ASAE é a versão à portuguesa de uma war on terror, sob a versão de consumer terror.

Durante anos creu-se que Portugal tinha as melhores leis do mundo, só não era eficaz na sua aplicação. Ninguém fiscalizava: as leis laborais, as melhores do mundo, "só não há quem fiscalize"; as leis administrativas, as melhores do mundo, "só não há quem fiscalize"; as leis penais, as melhores do mundo, "a polícia é que não presta"; a constituição, a melhor do mundo, "falta é aplicá-la".

Hoje surge então uma entidade fiscalizadora que funciona no campo sancionatório e, com tanto brado mediático, também no campo preventivo. Logo se "sentem as vozes dos egrégios avós" ecoando violações à liberdade. Simpatizo com estas vozes: gosto tanto de comer bolas de berlim ressequidas pelo sol, e especialmente de comer a bifanazinha com cabelo em dia de futebol, tanto como qualquer outro.

Mas assalta-me uma duvidança: a ASAE não se limita a fiscalizar e aplicar a lei da qual é, aliás, entidade fiscalizadora? O problema não está no excesso de regulamentação e não nos fiscalizadores da regulamentação? Se os deputados não gostam que a ASAE fiscalize as bolinhas de berlim, porque é que não legislam nesse sentido? E desde quando é que zelo passou a ser vício e não virtude de uma entidade de competência policial?

Mistérios lusos...

O assalto ao espectador

Por vezes, a crítica de cinema em Portugal tende a assemelhar-se a um combate de boxe, em que o crítico lança socos ao espectador culpando-o de uma potencial ida ao cinema. Ou, noutros casos, de ter optado por não ver um determinado filme. Em qualquer das situações, o crítico desiste de informar o leitor sobre os eventuais méritos ou deméritos da obra, preferindo ridicularizar o espectador pela sua decisão. Acham que estou a exagerar? Vejam este texto de Francisco Ferreira, no “Expresso”:

“Viu Gostam Todos da Mesma? Aplaudiu Os Tenenbaums? Foi sensível à liberdade de Um Peixe Fora de Água? E Bill Murray? Se os títulos nada lhe dizem, não perca tempo. Deve haver para aí um dramazeco pseudoformalista que você apreciará, um daqueles a vomitar sobre Douglas Sirk, como Expiação, mas lamentamos: você já se atrasou. Perdeu o comboio.”

O que é isto? Já nem falo da linguagem rasteira sobre "Expiação", um filme a que por acaso os seus próprios colegas do "Expresso", Leitão Ramos e Cintra Ferreira, atribuem 4 e 5 estrelas (coitados, devem apreciar vomitado cinematográfico). O que me intriga é o porquê deste ataque ao espectador, o qual, por uma série de razões, pode não conhecer nenhum dos filmes referidos. Por que motivo é ele tratado como um proscrito e um imbecil?

domingo, janeiro 27, 2008

Obama vence na Carolina do Sul...

... com um triunfo esmagador (55%), deixando Hillary (27) e Edwards (18) a uma longa distância. Obama contou naturalmente com o voto negro (81%), conseguindo excelentes resultados entre o eleitorado mais jovem (67% na faixa etária abaixo dos 30 anos) [ver dados aqui]. Nesta fase inicial das Primárias, Obama inverteu a lógica prevalecente nos últimos seis meses, que apontava Hillary como a super-favorita. Obama teve óptimos resultados em diferentes desafios eleitorais (no Sul, no Norte, no Oeste), vai recolhendo apoios (John Kerry, Caroline Kennedy) e conferiu definitivamente à sua candidatura um cariz “nacional”. “Yes, we can” já é mais que um simples slogan.

Esta situação só é possível porque Hillary Clinton cometeu vários erros de palmatória. O primeiro foi ter descrito o seu próprio triunfo como “inevitável”: transmitiu uma imagem de arrogância que apenas a enfraqueceu. Por outro lado, rodeou-se de uma série de conselheiros ligados ao establishment de Washington, conferindo um cariz demasiado artificial à sua candidatura e a ideia de uma continuidade política face ao passado – numa América que clama por mudança. E até mesmo a participação hiperactiva de Bill Clinton pode estar a trazer mais prejuízos do que benefícios (ofuscando a verdadeira candidata).

Mas Hillary não se ficou por aqui. No início da campanha, Hillary recusou por diversas vezes responder a perguntas nas sessões de esclarecimento. Naturalmente, o eleitorado não gostou de ver a sua digressão transformada numa espécie de cerimónia de aclamação. E nas últimas semanas, Clinton e o seu staff lançaram várias farpas a Obama, recorrendo a insinuações e a alguns golpes baixos para diminuírem a candidatura do seu rival. Os resultados estão à vista: no início de Dezembro, Clinton aparecia na frente das sondagens na Carolina do Sul; dois meses depois perdeu por 28 pontos de diferença. Semelhante desastre só é comparável à candidatura Republicana de Giuliani...

sábado, janeiro 26, 2008

Itália

Eis um país que adoro visitar mas no qual detestaria viver. A comida é intragável. Os italianos são ruidosos. Durante a Primavera e o Verão está um calor de morrer. Os condutores são loucos. A vida política é caótica: um governo sobreviver mais que três anos é um milagre; as agressões entre políticos é frequente e existe um manto de corrupção sobre todo o processo governativo. Os italianos são um dos povos mais xenófobos que existe na Europa. As cidades que conheço são sujas como poucas. A vida é estupidamente cara. As praias estão apinhadas de alemães. E toda a gente está extremamente preocupada em “divertir-se” e “viver de forma alegre” (uma das mais perigosas doenças dos tempos modernos).

Já sei, já sei: a Itália tem o perfume latino, o futebol, o vinho, a moda e uma série de coisas muito sofisticadas e altamente recomendáveis pelos destacáveis do “Expresso” e da “Men’s Health”. Com franqueza, dispenso.

sexta-feira, janeiro 25, 2008

Uma ilha rodeada por terra

quinta-feira, janeiro 24, 2008

América a votos: Democratas no Sul

As Primárias aproximam-se da sua fase decisiva. A luta entre os Democratas fica marcada pela acesa troca de palavras entre Hillary e Obama num debate a que o André se referiu anteriormente. Creio contudo que a imprensa sobrevalorizou a importância do evento. Numa campanha tão longa e tão disputada, a existência de quezílias é comum. Não acredito, pois, que o eleitorado se sinta especialmente mobilizado ou desagradado com um candidato em particular devido a estas situações, até porque, entre os Democratas, elas têm sido raras.

A próxima votação decorre no sábado, na Carolina do Sul. Edwards poderá ser ligeiramente beneficiado pela guerra de palavras entre Hillary e Obama, mas ficaria muito surpreendido se ultrapassasse os 20%. Num Estado onde o eleitorado negro tem uma importância decisiva, é provável que Obama vença. A questão relevante neste momento é saber com que vantagem: um triunfo por uma margem significativa (acima dos 10%) seria um tónico fundamental para a Super-Terça Feira, onde (quase) tudo se decidirá. Em sentido contrário, se Hillary ficar próxima de Obama, reforçará a dimensão transversal da sua candidatura, o que terá muito peso para o eleitorado Democrata que espera conquistar a Casa Branca em Novembro.

:: Última sondagem (ARG): Obama (45%), Clinton (36), Edwards (12).

o horizonte sensível, 9

Basileia, 2007

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quarta-feira, janeiro 23, 2008

Doidos à solta

No “Prós e Contras”, a historiadora Fátima Bonifácio afirmou que “não há provas científicas que garantam que o tabaco é prejudicial para a saúde”.

No “Frente a Frente” na SIC Notícias, a ex-deputada Odete Santos comparou o declínio dos mercados bolsistas desta segunda-feira ao "crash" de 1929, chegando mesmo a dizer que a crise actual é de maiores proporções do que a sentida na Grande Depressão.

Cavaco Silva jura a pés juntos que a recessão mundial será sentida em todo o planeta excepto neste belo jardim à beira-mar plantado. Sócrates alinha no coro e garante que estamos em pleno crescimento económico, não havendo evidentemente motivos para preocupações.

Não há dúvidas de que o espírito carnavalesco se antecipou este ano.

terça-feira, janeiro 22, 2008

Notas sobre o (mini-)debate do Partido Democrata

Enquanto ceava, assisti na CNN a um pouco do debate que opôs Hillary Clinton, Barack Obama e John Edwards. Eis o que pude concluir:

1) Clinton e Obama chegaram à fase da "discussão entre comadres". Ouvi-los atacando-se é quase o mesmo que ouvir as conversas entre os meus vizinhos: só mudam o estilo e a língua.

2) Edwards, sujeito com o qual antipatizo, consegue ser neste momento o político com o discurso de articulação mais discernível. Concorde-se ou não com o que diz, é o único que se faz compreender.

3) Clinton e Obama parecem atacar-se mutuamente não só porque sabem que o candidato do Partido Democrata à presidência sairá de entre ambos, mas também porque pouco mais têm que dizer de distinto entre ambos. Do pouco que se discutiu de política, pareciam defender exactamente as mesmas coisas.

4) Não há maneira de Edwards não vir a ser o candidato do Partido Democrata à vice-presidência (novamente).

5) Se John McCain vier a ser o candidato do Partido Republicano, qualquer um destes democratas (mantendo-se o actual tom da campanha) deverá ter medo: muito medo.

Mil palavras

Depois de discursar em Washington sobre a importância história de Martin Luther King, George W. Bush inclina-se para beijar uma jovem negra. Definitivamente, o amor não é recíproco. (via Andrew Sullivan)

segunda-feira, janeiro 21, 2008

Que dia é hoje?

Estar fechado em casa dias a fio, de volta de uma tese que não é ainda, pode ter as suas desvantagens. Uma delas é que por vezes já se nem sabe em que dia estamos: hoje é 20, 21, ou 22?, pergunto com frequência. A minha mulher acha isto muito perturbador, porque é psicóloga e num dos testes que aplica na avaliação da "maluquice" de uma pessoa, a primeira pergunta é precisamente "em que dia estamos?".

Hoje, acompanhando as notícias desportivas pelo DN, descubro aqui que o Benfica acompanha um craque português jogando actualmente na 2ª divisão holandesa, alguém que finalmente virá "resolver os problemas do Benfica" (expressão muito futebolística). O nome do sujeito é Tozé Marreco. Li outra vez, para ter a certeza: 2ª divisão holandesa, Tozé Marreco.

Creio entretanto ter perdido completamente o norte: o carnaval não é só no próximo mês?! Ou pior ainda, estamos já no primeiro de Abril?

Superstição invertida

Depois de ontem ter assistido à desqualificação da selecção nacional de andebol no campeonato do mundo, um jogador luso falhando um penálti decisivo no último segundo do jogo (foi mesmo assim, falhou mesmo um penálti mesmo no último segundo do jogo), fui atacado por uma síndrome de superstição invertida: será que dou azar às equipas que me aprazem?

domingo, janeiro 20, 2008

A luta dos Republicanos

No Nevada, Mitt Romney obteve uma vitória esmagadora (51%), num Estado onde os opositores praticamente desistiram de fazer campanha, tal era o seu favoritismo. O ultra-liberal Ron Paul obteve um surpreendente segundo lugar (16%), embora não tenha hipóteses de discutir a nomeação.

McCain venceu na Carolina do Sul com 33% dos votos. Este é um triunfo com uma importância especial, pois desde 1988 que o vencedor neste Estado acabou por ser também o nomeado do Partido Republicano. Por outro lado, ao triunfar num bastião conservador, McCain terá desferido um golpe letal na candidatura de Mike Huckabee, o preferido da “Direita religiosa” (ficou em segundo, com 30%).

Estes resultados fazem prever um entusiasmante mano-a-mano entre Romney e McCain, embora subsistam dúvidas sobre as hipóteses de Giuliani – cuja candidatura se poderá tornar um verdadeiro “case study”. Há seis meses atrás, Giuliani liderava folgadamente as sondagens nacionais e tinha boas hipóteses em New Hampshire e na Carolina do Sul. No entanto, preferiu não fazer campanha nestas primeiras eleições, apostando tudo na Florida e na “Super Terça-Feira”.

O problema é que os resultados catastróficos nas Primárias iniciais (sempre abaixo dos 4%) trouxeram grande erosão à sua candidatura. A última sondagem nacional já o coloca em quarto, e as hipóteses de vencer a Florida são agora bem mais diminutas. Se acabar derrotado na Florida, Giuliani e a sua estratégia serão recordados como um dos maiores desastres eleitorais de sempre.

Democratas no Nevada

Hillary Clinton venceu as Primárias no Nevada (51%), com um forte apoio do voto feminino (51%) e da comunidade hispânica (64%). A popularidade de Hillary junto do eleitorado hispânico pode revelar-se decisiva em Estados-chave desta disputa (a Califórnia e o Texas, por exemplo), onde este segmento eleitoral tem adquirido um maior peso.

Contudo, duas circunstâncias ensobraram a vitória de Clinton. Por um lado, Barack Obama (45%), mesmo perdendo no número de votos, conseguiu um maior número de delegados (13 contra 12 de Hillary), devido ao sistema de contagem do Nevada (que privilegia critérios geográficos e não populacionais). Por outro lado, Hillary obteve um péssimo resultado entre o eleitorado negro (14% contra 83 de Obama), o que prefigura grandes dificuldades nos Estados sulistas, onde existe um número elevado de afro-americanos. A próxima batalha disputa-se na Carolina do Sul e é bastante provável que Obama consiga um triunfo claro. Se assim for, Obama chegará à Super Terça-Feira (Primárias em vinte e dois Estados) na pole-position entre os Democratas, um cenário impensável há alguns meses atrás.

Obama continua a insistir num discurso de “mudança”, do qual a sua candidatura é um exemplo vivo: se eleito Presidente, tornar-se-ia o quinto Presidente mais jovem da história dos EUA, chegando à Casa Branca praticamente sem experiência política (apenas dois anos no Senado). Obama tem procurado juntar à grandiloquência dos seus discursos a imagem de um político capaz de reunir uma Administração competente e marcar o início de uma nova dinâmica governativa. Os resultados e as sondagens mostram que esta mensagem tem colhido frutos junto do eleitorado, e a possibilidade de Obama vir a ser o escolhido pelos Democratas já é algo mais do que um simples “conto de fadas”, para usar a expressão de Bill Clinton.

:: Dados sobre a votação no Nevada, aqui.

sexta-feira, janeiro 18, 2008

Pedir a quem pede

Nas Aventuras de Sherlock Holmes, Conan Doyle conta a história de um homem, corretor de bolsa, que, sendo visto à janela de um determinado quarto num bairro de má fama, dele desapareceu sem deixar rasto, aí sendo encontrado apenas um mendigo andrajoso e mudo. Mais tarde, o detective desvenda que o homem era afinal o mendigo: parece que o dito cujo descobriu que, ao vestir-se de vagabundo e ao mendigar pelas ruas, conseguiria auferir maior rendimento do que na sua actividade de corretor de bolsa. Todos os dias então saía de casa, vestido de fato e gravata, pasta na mão, dirigia-se para o tal bairro de má fama, disfarçava-se, e pedia: quando regressava a casa, vinha bem mais rico. Ele era The man with the twisted lip.

Vem isto a propósito de uma notícia na Visão desta semana, dando conta de um negócio na Rússia que proporciona aos abastados empresários locais uma maneira original de afastar o tédio das suas vidas, disfarçando-se de mendigos e pedinchando na rua.

Já falta pouco então para eu próprio começar a pedir aos pedintes...

Duvidança Especial (22)

- Conseguirá o Youtube conter a generalidade das minhas cenas cinematográficas preferidas?

Paranóia galopante

Tenho-me distanciado do exagero de alguns cronistas que nos últimos tempos – e sobretudo a propósito da nova lei do tabaco – misturam facilmente os termos “fascismo”, “Governo” e “tirania”, apregoando que a democracia está em perigo e os direitos individuais em risco. Mas confesso, que, ao ler certas notícias, fico com vontade de me juntar ao coro. Como esta, por exemplo. Deixo-vos um resumo:

"No próximo ano lectivo, os riscos do uso de telemóvel por peões entrarão pela primeira vez nos materiais pedagógicos de segurança rodoviária distribuídos pelas escolas [...]. José Trigoso, secretário-geral da Prevenção Rodoviária Portuguesa, afirma: «Não tenho nenhuma dúvida de que esses equipamentos provocam nos peões a mesma distracção causada a condutores» [...]"

"Embora não haja levantamentos estatísticos nem possa ser feita uma relação de causalidade entre o uso de telemóvel e os acidentes, José Trigoso admite haver necessidade de avaliar estas situações. Mais ainda do que a conversação, a PRP destaca o perigo causado pelas mensagens escritas (SMS). «São ainda piores, porque além da atenção concentram toda a actividade visual», destaca".

Não restam dúvidas de que certos sectores da máquina governativa estão armados em Brigada da Saúde. Com efeito, é extraordinário que alguém ache que os problemas de segurança no país estão relacionados com a utilização do telemóvel... pelos peões. Já dizia o outro: “neste país, está tudo doido”. Se não está, parece.

quinta-feira, janeiro 17, 2008

Desígnio nacional

Há seis meses atrás, se alguém criticasse o aeroporto na Ota era um traidor da pátria. Agora, aquele que ponha em causa a “opção Alcochete” pode esperar ser condenado à fogueira. Cada vez mais se torna claro que existe e sempre existiu um único e verdadeiro “consenso”: o interesse em adoptar mais um elefante branco. O tempo, o modo e o lugar são apenas pormenores.

quarta-feira, janeiro 16, 2008

Santana voltou

Depois de há umas semanas atrás ter feito um brilharete cultural ao abandonar uma entrevista a meio por haver sido interrompido sem motivo relevante, eis que Santana Lopes volta ao mesmo canal de televisão, à mesma hora, para ser entrevistado pela mesma jornalista.

Aproveitou agora para mal-dizer o governo actual e para se queixar novamente do mal que lhe fizeram quando foi primeiro-ministro.

É caso para dizer que o "menino-guerreiro" mostra-se bem mais menino do que guerreiro.

Primárias no Michigan

As sondagens previam uma disputa renhida, mas Mitt Romney superou claramente McCain. Romney (na foto) é o candidato preferido pelos Republicanos tradicionais (que se opõem aos impostos altos; críticos do “big government”; conservadores nos temas sociais e agressivos na política externa), mas uma campanha irregular e as derrotas no Iowa e em New Hampshire pareciam retirar-lhe hipóteses para a nomeação. Este triunfo vem no entanto trazer novo alento a Romney, e complicar ainda mais as contas no lado Republicano.

Com efeito, continuamos perante um cenário muito incerto. McCain era considerado um peso morto em Outubro, mas recuperou a tempo de vencer em New Hampshire. Embora não tenha conseguido reforçar a dinâmica de vitória conquistada na semana anterior, continua seguro na corrida com o segundo lugar no Michigan. Huckabee tem motivos para festejar. Venceu no Iowa e obteve honrosos terceiros lugares em New Hampshire e no Michigan (a rondar os 17%). Estes bons resultados em Estados do Norte (progressistas, com um eleitorado urbano) mostram que a candidatura de Huckabee não é episódica, nem se limita ao nicho dos “evangélicos”.

Há ainda que contar com Giuliani. O antigo Mayor de Nova Iorque continua a somar péssimos resultados (no Michigan ficou-se pelos 3%), mas a sua estratégia pretendia que concentrasse esforços nos grandes “prémios eleitorais”: Califórnia, Florida e Nova Iorque. É evidente que este mau início enfraquece a sua candidatura, mas é cedo para declarar o seu óbito. Uma (provável) vitória na Florida no próximo dia 29 seria um importante tónico para a eleição múltipla de 5 de Fevereiro (a “Super-Terça Feira”), a qual poderia inverter por sua vez estes desaires iniciais.

Os Democratas votaram maioritariamente em Hillary Clinton, mas, como referi antes, os resultados não serão tidos em conta porque o Michigan violou as regras do Partido. Obama e Edwards nem sequer constavam dos boletins de voto, pelo que é inócuo retirar conclusões políticas da votação.

terça-feira, janeiro 15, 2008

América a votos: Republicanos ao rubro

Nesta terça-feira o Michigan vota para as Primárias. A disputa entre os Republicanos promete ser crucial, especialmente para Mitt Romney, que liderou durante vários meses as sondagens no Iowa e em New Hampshire, mas acabou por perder para Huckabee e McCain. Romney tem uma máquina política bem oleada e com amplos recursos financeiros, mas a sua candidatura gera pouco entusiasmo entre o eleitorado: Romney é demasiado errático nas suas posições, não tem um discurso cativante, falta-lhe espontaneidade e o seu mormonismo suscita desconfiança. No Michigan, Romney joga uma cartada decisiva: uma vitória pode inverter a queda das últimas semanas; nova derrota – mesmo que mínima – produzirá certamente um golpe letal nas suas aspirações.

McCain é o principal adversário no Michigan. O enfant terrible do Partido Republicano é um dos favoritos a nível nacional e um triunfo esta noite reforçaria fortemente a sua candidatura, que renasceu em New Hampshire. McCain é uma espécie de antítese de Romney: não tem o apoio de uma máquina política forte, não tem muito dinheiro e não apresenta uma imagem muito cuidada, mas aposta tudo num discurso claro e incisivo. O antigo soldado tem uma vasta experiência política e a sua mensagem ao centro em questões sociais torna-o popular entre os independentes.

As Primárias Democratas no Michigan são irrelevantes. O Estado quebrou as regras do Partido antecipando a data da votação e a punição foi exemplar: a delegação do Michigan não será aceite na Convenção Democrata (o que significa na prática que os resultados não serão tidos em conta para a escolha do candidato). Edwards e Obama nem sequer constarão dos boletins de voto, pelo que será praticamente impossível retirar uma leitura política dos resultados.

:: Última sondagem (Reuters/Zogby): Republicanos: McCain (27%), Romney (24), Huckabee (15), Ron Paul (8), Giuliani (6).

segunda-feira, janeiro 14, 2008

Duas recordações, dois desejos

A convite do Ega – não, isto não é uma corrente – faço um breve exercício de memória. O livro de 2007? O divertidíssimo What If?, de que falei aqui: um estudo sobre a história que não aconteceu. Um misto de ficção, documentário e X-Files que me deu um gozo estupendo. E se pudesse escolher só um capítulo (porque o resto do livro é mais fraco), mencionava o segundo capítulo de O Mundo Sem Nós, de Alan Weisman, uma descrição irónica e subtil do planeta nas semanas seguintes ao desaparecimento dos seres humanos (sim, estou viciado na existência de "mundos paralelos" - este realmente já deu o que tinha a dar).

O filme de 2007? "Cartas de Iwo Jima". Uma meditação extraordinária sobre a inevitabilidade da morte, num cenário de guerra trágico, que gira em torno das diferentes atitudes de soldados e oficiais perante esse dado inexorável. Uma grande banda sonora, excelente realização, óptimos actores, belíssima fotografia.

Ideias para 2008? Suponho que "There will be blood”, de Paul Thomas Anderson, vai ser um grande filme. Gostava de assistir a algumas reposições, mas a Cinemateca anda obcecada pelo novíssimo cinema argelino e deve insistir no “Johnny Guitar” pela enésima vez. Se passarem “Ivan, o Terrível” ou “A Barreira Invisível”, vou de certeza. Quanto a livros, aguardo pelo que me chega às mãos. Estou a começar bem, com o excepcional “O Ataque à Razão”, de Al Gore. Segue-se “A Conspiração contra a América”, de Philip Roth, que também promete. Mas suspeito que vai haver pouca literatura, alguma história e muita filosofia e política. Nothing to be done...

domingo, janeiro 13, 2008

a arte da fuga, 22

August Macke, Dame in grüner Jacke, 1913

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sexta-feira, janeiro 11, 2008

«You know, those couples that tend to look alike», Seinfeld

Em Inglaterra, parece que houve anulação judicial do casamento contraído entre dois gémeos separados à nascença.

Lá que isto transpira estranheza, não há dúvida. Mas força-me a pensar. Não será o mais perfeito casamento aquele em que duas pessoas têm sexo enquanto se animizam como irmãos? E não será a mais perfeita irmandade aquela em que duas pessoas filhas de mesmos progenitores se amam sem terem sexo?

Estes gémeos foram ambiciosos. Quiseram o perfeito casamento na perfeita irmandade, com exclusão de tudo o resto. Na contradição efectiva, perderam tudo.

quinta-feira, janeiro 10, 2008

[Pub.]

Escrevi aqui há uns meses que estava a trabalhar na tradução de um livro. Pois bem, a tarefa está concluída e a obra sai esta sexta-feira com o "Público" (por mais 16,90 euros). A edição é da Esfera do Caos e estará à venda nas livrarias a partir da próxima semana. O livro, intitulado "Retratos de Coragem" (Profiles in Courage), é da autoria de John F. Kennedy, tendo sido redigido pelo então Senador americano em 1955.

Trata-se de um texto notável sobre a coragem política que, apresentando um vívido retrato de várias personalidades históricas americanas, sublinha a necessidade de a prática política atender às necessidades do bem comum e do interesse nacional, o que implica muitas vezes um conflito com aspirações regionais ou interesses locais. O propósito é essencialmente histórico e político, mas a narrativa de oito actos heróicos levados a cabo por patriotas americanos ao longo da história americana possui um cunho novelesco que torna a leitura especialmente atractiva.

Num período em que a política atingiu um dos pontos mais baixos de sempre, talvez valha a pena conhecer este manifesto que releva a ética e a coragem como fundamentos essenciais da prática política.

Aeroporto em Alcochete

Mário Lino deve estar com uma desagradável indigestão, tal foi o tamanho do sapo que engoliu. Sócrates reincidiu num número de circo, em nova demonstração de relativismo moral. Com franqueza, já nem são as decisões políticas que mais me preocupam neste Governo, mas sim a absoluta desfaçatez e a falta de carácter do primeiro-ministro.

Entendam-me: não é a escolha de Alcochete que está em causa (não tenho competências técnicas para ajuizar a opção). Mas é difícil não ficarmos inquietos perante os permanentes recuos e mudanças de estratégia, sinais de um Governo à deriva. O mesmo Governo que, há seis meses, zombava daqueles que colocavam dúvidas sobre a Ota, gozando literalmente com a crítica. Eram os “Velhos do Restelo”, exclamavam. “Os que falam, mas não fazem” – por oposição às mentes iluminadas do Governo, “homens de acção”, “irredutíveis nas suas convicções”.

Sócrates aparecer agora perante os cidadãos com uma postura angélica, reclamando que a sua decisão se deveu a um acto de ponderação, é uma mistificação pura e simples. Mais um pouco de areia para os olhos. Mais um gesto de propaganda (quão conveniente é este anúncio um dia depois da polémica do “não-referendo”?). Mais um exemplo de contorcionismo político – no qual, diga-se de passagem, Sócrates se tem revelado mestre.

O não-referendo: as máscaras da Esquerda

É interessante observar a histeria com que o BE e o PCP reagiram ao anúncio de Sócrates, exclamando que a Pátria está em perigo e profetizando o fim do mundo. Seria bom compreender o que está verdadeiramente por detrás deste entusiasmo.

Com efeito, o BE e o PCP não desejam um referendo para “aprofundar a dinâmica popular da construção europeia”, como apregoam, mas sim para rejeitar o Tratado e bloquear tanto quanto possível essa mesma construção europeia. Suspeito, aliás, que haja no BE e no PCP muita gente que gostaria de regressar ao escudo, abandonar a União Europeia e voltar às fronteiras patrulhadas de outros tempos.

quarta-feira, janeiro 09, 2008

O não-referendo: a falta de vergonha

Sócrates perdeu o resto da dignidade política que ainda lhe restava. Voltou a quebrar uma promessa eleitoral, andou a reboque de um político esloveno (!?) e refugiou-se numa argumentação ridícula (que prometera referendar a Constituição Europeia e não o Tratado Reformador). Num país esclarecido, seria severamente punido nas urnas. Mas em Portugal é provável que seja reconduzido confortavelmente para um segundo mandato.

:: Ler este post e este post do Pedro Correia.

O não-referendo: uma fuga cobarde

Defendo a realização de um referendo porque entendo que prolongar a construção europeia à margem dos cidadãos constitui um erro estratégico grave. É certo que haveria ruído na discussão pública – mas seria preferível existir algum debate ou mesmo um mau debate do que não haver nenhum debate. Dizem os líderes políticos que o “não” poderia ganhar, bloqueando a aprovação geral do Tratado. Este argumento só mostra a falta de confiança que os mesmos têm em si próprios: pois se acreditam no valor do Tratado, resta-lhes empenharem-se a fundo para convencer os cidadãos dos seus méritos. Preferindo o expediente parlamentar, os políticos nacionais optam por uma fuga cobarde às suas responsabilidades.

Primárias em New Hampshire

No New Hampshire registou-se uma votação histórica, a mais participada de sempre numas eleições primárias neste pequeno Estado. Apesar das baixas temperaturas, cerca de metade dos eleitores votaram para escolher os candidatos presidenciais. Estranhamente, ainda há quem tenha dúvidas sobre o carácter democrático deste processo, apelidando-o de “medieval” e “anacrónico”.

No lado Republicano, John McCain (na foto) obteve uma vitória assinalável e relança a sua candidatura. McCain tem uma experiência política incomparável, mas representa um discurso de continuidade face à política actual de George Bush, o que o torna frágil perante uma boa parte do eleitorado nacional. Romney perdeu novamente e ficou em maus lençóis, tendo sido punido sobretudo pelo seu discurso errático. Giuliani voltou a ter um mau resultado. Continua a apostar tudo nos grandes Estados, mas é provável que este arranque medíocre condicione negativamente a sua estratégia. Em todo o caso, a luta entre os Republicanos promete ser acesa.

Entre os Democratas registou-se uma contenda apertada, com uma vitória tangencial de Hillary Clinton. As sondagens indicavam que Obama triunfaria, mas uma inversão na estratégia de Clinton nos últimos dias foi determinante. A ex-Primeira Dama adoptou um tom mais contundente e tirou dividendos do seu apelo emocionado ao voto feminino, que até incluiu lágrimas. Obama perdeu assim uma boa oportunidade para reforçar a aura vencedora conquistada no Iowa, mas está de pedra e cal na corrida. Todavia, Hillary continua a ser a favorita a nível nacional.

A posição de John Edwards poderá ser decisiva na disputa Democrata. Os seus resultados não lhe permitem acalentar esperanças para a nomeação, mas Edwards possui um importante capital político e, caso desista e apoie um dos outros candidatos (mesmo que numa etapa futura), desequilibrará as contas. Até aqui, Edwards tem-se mostrado mais próximo de Obama, mas se sentir que a dinâmica de vitória se transferiu para Hillary, poderá reconsiderar a sua posição (porventura na esperança de alinhar ao seu lado como candidato a vice-presidente em Novembro).

terça-feira, janeiro 08, 2008

A imagem da democracia é a democracia da imagem

Durante a minha hora de almoço, vi na CNN uma senhora habitante do New Hampshire, apoiante de Barack Obama, ser perguntada quais as opiniões do seu candidato de eleição sobre educação, saúde, relações internacionais, e ambiente. Não soube responder a nenhuma das perguntas.

Perguntada então por que motivo votaria em Obama, respondeu: «I'm learning more and more about him everyday. He's got big brown eyes, and I like that

Não há dúvida de que as eleições são acontecimentos divertidos.

O choque tecnológico na PSP

Recentemente, a minha rua foi atacada pelo irritante alarme de um stand de automóveis, que teimava em disparar durante a madrugada, prosseguindo a sua odisseia de ruído até às primeiras horas da manhã. Não conseguindo adormecer, telefonei à polícia municipal e informei-os do sucedido. Perguntaram-me o meu nome e a minha morada, bem como o endereço do stand. Mas nada se alterou.

Este cenário repetiu-se durante as três noites seguintes. O diálogo era sempre o mesmo: eu queixava-me, a polícia pedia-me os meus dados e os do stand, e garantia-me que tudo seria resolvido. Acabava o telefonema e o barulho continuava. Estando já exasperado, interroguei num dos telefonemas nocturnos: “Mas por que é que me pedem o meu endereço outra vez? Eu já lhes disse o meu endereço mais de cinco vezes! Vocês não guardam esses registos?

“Claro que não!”, respondem-me. Exclamo, surpreendido: “Está a brincar comigo! Então de cada vez que eu faço uma queixa, vocês anotam o meu nome e a minha morada e depois não sabem do registo?”. Nova resposta de antologia: “Ouça, eu escrevo o seu nome aqui numa folha de papel! Mas depois deito-a para o lixo. Pensei estar num programa de apanhados. Mas o polícia logo explicou a sua lógica: “Já imaginou se nós guardássemos os registos de toda a gente que nos telefona?”

Mesmo cansado, voltei à realidade. Recordei-me de que esta gente não faz a mais pequena ideia do que é um computador. Recordei-me de que o plano tecnológico não passa de uma manobra de propaganda para encher telejornais. Recordei-me de como os mais velhos resolvem os problemas: esperei pela manhã, vesti um casaco e fui-me entender com o dono do stand. Naturalmente, a polícia ainda deve andar a esta hora à procura do meu endereço nos caixotes do lixo, para então iniciarem um “processo de averiguação”. Mas suspeito que ainda vão demorar um bocado.

segunda-feira, janeiro 07, 2008

Problemas com os vizinhos

Quando Raskolnikof decide pôr em acto o seu anseio de homicídio, parece estranho (pelo menos pela experiência que me toca) que não tenha escolhido um seu vizinho.

Ou talvez Dostoievski não tenha escolhido um vizinho como vítima de Raskolnikof precisamente porque em tal caso: 1) não houvesse crime, ou; 2) a haver crime, não seria legítimo um castigo.

América a votos: a importância do New Hampshire

Na terça-feira disputam-se as eleições primárias no New Hampshire. Trata-se de um Estado muito pequeno e com uma população escassa (1,2 milhões), mas com grande importância estratégica neste processo – essencialmente por três razões.

a) O New Hampshire permite testar a popularidade dos candidatos num grupo ideológico distinto do Iowa; enquanto este é um Estado do Midwest, rural e conservador, onde a religião e os valores tradicionais são determinantes, o New Hampshire é um Estado da Costa Leste, virado para o comércio e as profissões liberais, onde os temas da economia, da política externa e da saúde são considerados prioritários.

b) O New Hampshire é um dos chamados “Estados voláteis” (swing states), ou seja, que na eleição presidencial não tem uma tendência de voto historicamente muito marcada. Na verdade, trata-se mesmo de um dos Estados onde as votações são mais disputadas. Nesse sentido, o New Hampshire funciona nas Primárias como um importante barómetro das tendências de voto futuras: os candidatos que obtiverem uma maioria terão maiores probabilidades de conquistar o Estado em Novembro, pelo que o eleitorado nacional valorizará especialmente o seu triunfo.

c) Caso confirme uma tendência eleitoral verificada no Iowa, o New Hampshire reforça o efeito psicológico do triunfo perante o eleitorado nacional. Somando dois êxitos consecutivos, o candidato adquire um grande capital político e reforça a sua dinâmica de vitória. É por isso que Hillary Clinton tanto receia um novo triunfo de Obama. Mesmo estando à frente nas sondagens nacionais, a antiga Primeira-Dama sabe que uma derrota no New Hampshire catapultará a candidatura de Obama, transmitindo a ideia de que Hillary parece impotente para travar o seu adversário.

A maioria das sondagens pós-Iowa atribui o favoritismo a Obama, embora a luta se preveja extremamente renhida. No lado Republicano, John McCain tem boas probabilidades de vencer e de assim relançar uma candidatura que passou maus momentos (sobretudo em termos financeiros). Romney, o candidato mórmon, deverá ficar em segundo lugar. Giuliani é pouco popular no New Hampshire, pelo que o espera um resultado fraco.

:: Últimas cinco sondagens (valores médios): Democratas: Obama (35%), Clinton (30), Edwards (20). Republicanos: McCain (33), Romney (28), Huckabee (11).

sábado, janeiro 05, 2008

Coisas que fazem rir, 20

Terá sido o autor desta obra um colega de turma de Sócrates na Independente?

sexta-feira, janeiro 04, 2008

O BCP e as teorias da conspiração

A Visão desta semana inclui todo um artigo tentando "explicar" como o Millennium BCP passou das mãos da Opus Dei para as da Maçonaria. Esta tendência de ver conspirações em todo o lado sempre me faz lembrar uma frase de Umberto Eco, no seu O Pêndulo de Foucault:

«Eu digo que existe uma sociedade secreta com ramificações em todo o mundo, que conspira para difundir o boato de que existe uma conspiração universal.»

América a votos: Primárias no Iowa

Barack Obama obteve um triunfo espantoso (38%). Em primeiro lugar, porque suplantou dois candidatos com maior experiência e capital político. Hillary Clinton (29%) tem vindo a preparar afincadamente a sua candidatura presidencial ao longo dos últimos três anos, e John Edwards (30%), um sulista com preocupações sociais muito vincadas, está mais próximo do eleitorado tipicamente conservador do Iowa. Por outro lado, Obama venceu num Estado onde 95% dos habitantes são brancos, o que atesta bem o quão transversal e verdadeiramente singular é a sua candidatura. Obama não representa apenas um discurso mais racional e progressista nos EUA; ele é cada vez mais a face visível de um desejo de mudança que habita silenciosamente o coração de muitos americanos.

Os resultados entre os Republicanos são menos surpreendentes. O candidato favorito dos evangélicos, Mike Huckabee, venceu folgadamente (com cerca de 10 pontos de vantagem). No entanto, as suas hipóteses a nível nacional são ainda pequenas. É um candidato com pouca implementação nos grandes aglomerados urbanos e com um discurso demasiado encostado à direita (considera a homossexualidade um pecado; não aceita a teoria da evolução; quer reforçar as leis contra a imigração). Mitt Romney, apesar do segundo lugar (25%), sofreu um forte abalo, pois era até aqui o favorito do eleitorado mais conservador – eleitorado esse que terá agora que disputar de forma acérrima com Huckabee.

Os candidatos mais moderados entre os Republicanos (McCain e Giuliani) tiveram resultados bastante fracos (13 e 4%, respectivamente), mas é um dado que não deverá ter grande impacto nas suas candidaturas, pois aqueles derivam sobretudo da natureza específica do eleitorado do Iowa, e não tanto a insuficiências da campanha. No entanto, ambos necessitam de um bom resultado nas Primárias de New Hampshire (dia 8), de forma a evitar uma potencial desmobilização do eleitorado que lhes é mais favorável.

quinta-feira, janeiro 03, 2008

Presidência portuguesa da UE: o reverso da medalha

A imprensa nacional elogiou de forma unânime o trabalho de Sócrates e da diplomacia portuguesa durante os seis meses da presidência da UE. As televisões e os jornais traçaram um cenário dourado, repleto de feitos extraordinários. Mas... terá tudo sido um mar de rosas? Os observadores internacionais tecem alguns elogios, mas foram bem mais críticos. Veja-se por exemplo esta análise no Euobserver.com (via O Diplomata):

"[...] Lisbon then caused a small PR fiasco out of the final signing ceremony of the document in December. It insisted that the treaty should become the Lisbon Treaty and be formally signed in the Portuguese capital, undermining the green credentials of the EU as leaders flew to Lisbon on 13 December only to fly back later in the day for the traditional end-of-year summit in Brussels.

«This was a bit of a narrow approach,» Mr Incerti told EUobserver «Instead of saying: this is a treaty for Europe and it doesn't matter where it is signed, they said: We are Portugal and this is the treaty of Lisbon.»

[...] Meanwhile, the leadership style of the Portuguese presidency was characterised not only by the smooth presentation skills of prime minister Jose Socrates but also by the sometimes ad hoc approach Portuguese officials of meetings in Brussels. The VAT and Galileo deals, for example, only came about after lengthy and gruelling deliberations which saw the presidency regularly suspend the talks for «five minute breaks» which ended up being «breaks of more than an hour», some EU diplomats complained.

Portuguese lunches are said never to have started before two o'clock, while meeting agendas and speaking times for the EU-Africa summit were distributed only at the very last minute. After the October summit in the Portuguese capital, EU leaders had to wait for hours at Lisbon airport before their planes could depart, since the presidency had not secured enough slots for all 26 government planes to jet off quickly."

o horizonte sensível, 8

Botswana, 2007

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quarta-feira, janeiro 02, 2008

A inveja é uma coisa muito feia

Cavaco Silva criticou no seu tempo de antena da RTP (a que se chama carinhosamente "mensagem de Ano Novo") as elevadas remunerações dos gestores das grandes empresas portuguesas. O povo aplaude. Mas não é estranho?!: um tão eminente economista, ex-ministro das Finanças, ex-primeiro-ministro com maioria absoluta, professor universitário de economia... E só agora é que repara que há gente a receber mais do que merece? Talvez por razões óbvias: "se eu sou presidente agora, ninguém devia ganhar mais do que eu".

Alguém tem um cigarro?

Nunca fumei. Mas depois de ser bombardeado com a suposta aquisição de vigência de um cemitério de letras anatematizando quem fuma onde é costume fumar, bem penso agora: alguém tem um cigarro que me possa ceder?

América a votos: a importância do Iowa

Começam amanhã no Iowa as Primárias dos EUA, as quais irão definir os dois candidatos às eleições presidenciais de Novembro. Trata-se de um procedimento semelhante a uma eleição partidária interna, que contudo assume um carácter mais geral (porque nela participam todos os Estados) e plural (porque aberto ao voto de não-militantes dos partidos). Através de um complexo sistema de votação, que tem em conta o peso demográfico de cada Estado, os diversos candidatos vão conquistando apoios, que se traduzem na obtenção de um conjunto de “delegados” favoráveis à sua candidatura (mas que reproduzem os resultados da votação popular).

Sendo o Iowa um Estado com uma população pequena (3 milhões, cerca de 1% dos habitantes totais dos EUA), por que é tão importante esta votação? Essencialmente por dois motivos. O primeiro deriva de um aspecto singular das Primárias: o facto de as votações não serem simultâneas em todos os Estados. As regras do jogo permitem que a população de oito Estados exerça o seu voto em dias distintos ao longo do mês de Janeiro, antes da eleição simultânea de 5 de Fevereiro (na qual votam dezanove Estados) e de outras votações subsequentes.

Porque os resultados são anunciados de imediato, as eleições nestes primeiros oito Estados têm um formidável efeito psicológico, que muitas vezes condiciona as votações posteriores. Os candidatos triunfantes no Iowa surgem perante a nação com uma aura vencedora, mesmo que a nível nacional existam outros candidatos mais fortes. Pode haver assim um “efeito dominó”: um triunfo aparentemente inócuo num Estado pequeno transforma-se numa vitória “nacional”, e o candidato salta de forma quase imediata para o topo das preferências em vários Estados.

Por outro lado, o Iowa, Estado predominantemente conservador, serve de importante barómetro para as possibilidades dos candidatos na disputa final de Novembro. Os Republicanos estão no seu território natural, pelo que é relevante saber se os candidatos “internos” do partido são ou não capazes de mobilizar o seu eleitorado tradicional. Giuliani, por exemplo, tem poucos apoios no Iowa, facto que poderá prejudicar a sua candidatura, mesmo que as sondagens lhe dêem o favoritismo a nível nacional.

Para os Democratas, esta é uma oportunidade para observarem a sua capacidade de penetração num eleitorado hostil, sem uma parcela do qual nunca poderão vencer os Republicanos. É certo que Hillary Clinton ou Barack Obama nunca triunfarão em Estados muito conservadores como o Texas ou o Mississipi, mas a obtenção de um bom resultado no conservador Iowa pode ser um bom prenúncio para as hipóteses futuras em Estados decisivos como o Ohio ou a Florida (Estados moderadamente conservadores, com grande peso populacional e votações tradicionalmente equilibradas entre os dois partidos).

:: Última sondagem no Iowa: Republicanos: Huckabee (30%), Romney (27), McCain (12). Democratas: Clinton (29%), Obama (27), Edwards (25).